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Pomada de tosse

observatório de ornitorrincos

Segundo consta da agenda da Assembleia da República, hoje, quinta-feira, 9 de Março de 2006, toma posse como Presidente da República Portuguesa o Professor Doutor Aníbal Cavaco Silva, eleito na primeira volta das eleições presidenciais realizadas em Janeiro.

Repare-se como em quatro linhas se cumprem todos os requisitos importantes para fazer jornalismo em Portugal sem correr o risco de a PGR mandar confiscar o meu computador, além de ter realizado um sonho antigo que era imitar com a maior semelhança possível o estilo “telex LUSA”:

a) respeitinho pelas figuras de Estado;

b) identificação das fontes;

c) não revelar nenhuma informação em segredo de justiça;

d) não exigir a demissão de Souto Moura.

Devo dizer que receio diariamente por uma rusga policial ao meu equipamento informático que me confisque a CPU e leve o resultado do meu esforço de todo um semestre, durante o qual consegui, após uma árdua luta diária contra as dificuldades do sistema, alcançar bons resultados no Football Manager 2006. E revolta-me que qualquer inspector policial ou magistrado do Ministério Público possa depois utilizar as minhas tácticas e treinos personalizados para poder assim vencer facilmente a Liga portuguesa com o Porto ou o Benfica.

A tomada de posse de Cavaco Silva (“Senhor Professor, como vai? A família tem passado bem? Por cá, também, muito obrigadinho. Tenho visto a Sôtora Maria, anda com bom aspecto. Os meus cumprimentos e qualquer coisa que precise, disponha sempre, sim, Senhor Professor? Com licença. Não, faça favor. Obrigadinho. Adeusinho”) tem sido assinalada como uma reviravolta no sistema político português, por ser o primeiro Presidente da República depois do fim do Estado Novo que não foi um lutador “anti-fascista”. É provável que Cavaco (“Senhor Professor, boa tarde!”) não tenha sido o combatente pela liberdade que foi, por exemplo, Freitas do Amaral, conhecido pelo seu passado de clandestinidade oposicionista contra a licenciosidade do governo de Marcello Caetano, mas foi um corredor de 400 metros barreiras. Pode não ter sido eleito com apoio do PS, mas quem percebe de atletismo sabe que nas corridas de pista as curvas são sempre para a esquerda.

Apesar do meu fraco entusiasmo com a candidatura de Cavaco Silva (“Oh Senhor Professor, eu nessa altura tive uns problemazinhos, mas isso já passou e estou contentíssimo de o ver aí onde está”) no Verão passado, espero agora que assuma todas as suas prerrogativas de Chefe de Estado, entre as quais se incluem a protecção de jogadores de FM 2006 e Pro Evolution Soccer perante as originalidades do sistema judicial português.

Para os próximos dez anos desejo muita paz e saúde para o Senhor Presidente da República, para o Senhor Procurador-Geral da República, para o novo presidente da Entidade Reguladora da Comunicação Social, para todos os senhores juízes, para os senhores inspectores da PJ e para toda a gente que pode entrar nas redacções e levar os computadores onde não só se encontra toda a vida profissional de um jornalista como uma grande parte da sua vida sexual.

Gostava de dirigir uma palavra final a Jorge Sampaio: aprenda com o seu amigo Mário Soares e daqui a dez anos deixe-se estar onde estiver, a escrever discursos para adormecer os netos ou qualquer coisa do género. (Quando ele ler isto já não pode mandar o Souto Moura cá a casa, pode? Como não sei a que horas é a tomada de posse, o melhor é acautelar-me. Um grande abraço para o Doutor Sampaio também, sim? Muitas felicidades.)

Por: Nuno Amaral Jerónimo

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