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Pode ser que tudo se componha

Jogo de Sombras

Se a política são ideias ao serviço de projectos e em nome de causas, então a política na Guarda está quase morta. A novela da abalada do vereador Luís Costa do executivo municipal deu na zaragata de sempre entre os do costume. Decerto a cidade – e, em particular, a Câmara – podia ter coisas mais importantes de que se ocupar e assuntos mais interessantes em que pensar. Mas não conseguiu passar ao lado dos desabafos, das queixas e das acusações. Não por conta do vereador, propriamente. De há um ano para cá – desde que tentou assumir um protagonismo rebelde em relação à própria bancada – não se lhe tem ouvido uma palavra. Até neste processo foi gerindo um cauteloso silêncio, só quebrado por duas entrevistas em que tentou pôr-se de bem à vez com Deus e com o Diabo. Porque, pela parte que lhe diz respeito, a questão nem era tão complicada: quis fazer coisas novas nos últimos meses, incluindo uma pós-graduação, que não lhe deixam tempo livre para as fainas autárquicas. Quem verdadeiramente criou a confusão foi Ana Manso, que puxou do caso para usar a expressão que já tem cristalizada no discurso, denunciando mais esta «birra do executivo socialista da Câmara da Guarda e da sua presidente», agora por não querer mudar as sessões quinzenais para a Segunda-feira. O que, já agora, lhe dava jeito também a ela, vereadora da oposição, que chega a estar meses impedida de comparecer por incompatibilidade com os deveres de deputada. Claro que dizer as coisas assim é pôr-se a jeito: com um esgar velhaco, a maioria PS votou pela manutenção do dia das reuniões, usando da perissologia saloia que consiste em lembrar, sempre que o assunto vem à baila, que quem concorreu à Câmara se sujeitou a ganhar ou a perder, conhecidas que eram, de véspera, as regras do jogo. E Maria do Carmo Borges ficou mais uma vez a rir-se para dentro, como quando, há seis anos, propôs passar a sessão para a Quarta-feira e trocou as voltas ao candidato derrotado Carlos Andrade, que tinha casa e emprego a 500 quilómetros da Guarda. Por estas e por outras a oposição na Câmara da Guarda resume-se hoje ao vereador Crespo de Carvalho, o único que marca presença com regularidade, prepara os assuntos e intervém com autoridade. O PSD perde, aos poucos, a batalha que se propôs travar na autarquia. Perde-a nos espíritos e perde-a na opinião pública. E com isso permite à maioria socialista ir gerindo as suas próprias divisões e disfarçando as suas próprias fragilidades. António José Teixeira, insuspeito, fez no Dia da Cidade uma oração politicamente incorrecta, pondo a tónica nas quatro maiores ausências desta cidade: alma, estima, ideias, vontade. A gente de cá bateu as palmas da praxe: era só mais uma sessão solene num dia feriado. E entre o «se Deus quiser» e o «Graças a Deus», pode ser que tudo se componha.

Por: Rui Isidro

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