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Pelo fanatismo

observatório de ornitorrincos

Na passada terça-feira saiu com o Público um livrinho de Amos Oz chamado Contra o Fanatismo. Não percebo esta atitude intolerante contra o fanatismo. Mas porquê? Só porque se começou a dizer que os fanáticos são todos bombistas e atiram aviões contra prédios. Há um preconceito social inaceitável contra os fanáticos. Os fanáticos não são todos iguais. Além disso, é preciso aprender a respeitar as diferenças. Os fanáticos também são pessoas. Dizem. Mas o senhor Oz, que escreveu este livro, é judeu, e já se sabe como são os judeus. É gente que não interessa, como se aprendeu nos Evangelhos, nem ao menino Jesus.

Defendo claramente que não devemos andar no mundo com atitudes negativas deste género. Agora somos contra o fanatismo, amanhã somos contra o terrorismo, para a semana já não gostamos de assassinatos selectivos, e quando damos por nós estamos no limite do totalitarismo, a proibir e a fechar McDonald’s por esse país fora.

Considero ser extremamente importante poder ser-se fanático. (Para se poder comparar, considero que poder fazer chichi na beira da estrada é apenas moderadamente importante.) Afixar cartazes onde se deseja “Boa Viagem” aos imigrantes é tão estúpido como dizer (como disse um prémio Nobel da Literatura português, mas que agora não interessa nomear, para não acicatar rancores) que a democracia é uma merda. E, reparem, o cartaz xenófobo até é mais bem educado. Por isso, deixemos os fanáticos entretidos com as coisinhas lá deles e ocupemo-nos do que é realmente importante para o país. (Não olhem para mim, perguntem ao primeiro-ministro que ele é que sabe o que é importante.)

O que é afinal um fanático? É apenas alguém que pensa que deve morrer por uma causa em que acredita muito e a mulher ficar a receber a pensão de viuvez ou que deve matar outro que não acredita na mesma coisa ou pelo menos que diz os RR de forma diferente. Um exemplo: as pessoas que não gostam do fumo de tabaco acham que os seres repugnantes que fumam deviam morrer de cancro de pulmão antes dos 45 anos. E de preferência numa urgência desactivada. Tudo bem, essa gente pode ser fanática. Mas o governo, por exemplo, está do lado deles. E o governo – Deus, a ERC e os tribunais me livrem e guardem de dizer alguma vez o contrário – tem sempre razão. E está do lado dos fanáticos. Percebe o leitor onde quero chegar? Sim, é ao quarto de dormir de Katie Holmes, agora que o Tom Cruise já de lá saiu. Mas estava a falar de uma conclusão. Que é esta: os fanáticos também podem ser boas pessoas. Vejamos. Um bombista suicida, um tele-evangelista ou um macaco dos No Name Boys podem muito bem ser criaturas de levar as sobrinhas a passear, ao passo que eu não tenho paciência para levar a petiz da minha querida irmã a nenhum lado. E eu sou um gajo que se está nas tintas para tudo e só sou fanático por causas como o bushismo (de Sophie Bush), o movimento green (de Eva Green) ou, no máximo, a defesa da casta (de Laetitia Casta). Ou seja, há com certeza por aí muito fanático com vidinha mais decente que a deste escriba. Mas provavelmente já deve haver à venda livrinhos que recomendam o fim de gentinha de moral duvidosa, princípios escusos e comportamentos repreensíveis, como é o caso. Assiste-lhes o direito de pensar assim, e no fundo, nem sequer é propriamente fanatismo. É sabido que homens de 35 anos, solteiros e com a casa cheia de livros são fascistas ou homossexuais (ou ambos) e a sociedade não precisa de gente desta para coisa nenhuma. E quando só se quer aniquilar gente inútil (como autores de colunas idiotas), não se é um fanático, é-se um tipo que defende a ordem e é vigoroso nos princípios.

Por: Nuno Amaral Jerónimo

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