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País, Bom Estado, Vende-Se

Ninguém acredita que consigamos pagar as nossas dívidas. Nem as agências de rating, nem os nossos credores, nem os alemães. E nós próprios começamos a ter sérias dúvidas sobre o assunto, talvez fundadas. É verdade que não o mostramos muito: continuamos a exigir melhores salários e condições de trabalho, mais regalias sociais, mais poder de compra. São justos esses nossos direitos, tão justos, ou mais, pensamos, como os dos nossos credores. Estes, na sua simplicidade, apenas exigem que paguemos no prazo o que nos emprestaram. É verdade que é um direito deles, tão legítimo como o nosso de achar que eles devem esperar, ou então exigir o pagamento aos ricos. “Os ricos que paguem a crise”, não é?

Há um problema. Precisamos de duas coisas: que nos dêem facilidades de pagamento e que nos emprestem mais. É que, entretanto, enquanto as letras se venciam, tivemos por cá mais necessidades e não ganhámos o suficiente para as pagar. Por isso, dava-nos jeito que nos emprestassem dinheiro para pagar os juros das letras vencidas e mais algum para podermos comer. “Se não fosse muito incómodo, claro”. “Já agora, também precisávamos de dinheiro, muito, para continuar a pagar prémios milionários aos gestores públicos, reformas luxuosas às altas patentes da Função Pública, remediadas ao resto, auto-estradas, escolas, hospitais, aeroportos e o TGV”. Basta preencher o requerimento, selar e meter no correio. E esperar pelo milagre. Sentemo-nos todos, num perfeito círculo, e oremos. Diz-se que uma oportuna escolha de palavras, debaixo de um céu propício, pode fazer milagres, e vêm aí o 13 de Maio e o Papa.

Entretanto, tivemos a greve dos transportes. Tivemos ainda os alemães a dizer aos gregos que, se querem ajuda, vão ter de sacrificar-se muito mais do que pensam os seus governantes e muitíssimo mais do que desejariam os sindicatos. Lá, na Grécia, como desgraçadamente por cá, os espíritos têm relutância em passar da agenda dos direitos para a das obrigações. E não entendem que esses muitos milhões que se devem, são devidos por todos – e que há que pagar sob pena de não nos emprestarem mais e não entendem também que, se não nos emprestarem mais isto pura e simplesmente não funciona.

Mas há uma esperança: vem aí, ainda em 2010, Hu Jintao, o presidente chinês. Tem dinheiro no bolso, está até sentado nas maiores reservas de divisas do Mundo. Talvez goste do nosso Sol, das nossas praias, da nossa gastronomia – ou das nossas casas.

Por: António Ferreira

Comentários dos nossos leitores
Manuel Santos marsantinho@sapo.pt
Comentário:
Embora não simpatize com a sua pessoa – até porque já me deu razões para isso, no passado – acabei por lhe deixar um voto, pelo seu texto.
 

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