Em dia de Reis, a Assembleia Municipal da Guarda recebeu a visita dos alunos da escola do Bonfim que cantaram as Janeiras aos deputados. Mas nesta sessão extraordinária, realizada na terça-feira, a música foi outra para a maioria socialista na Câmara. É que a oposição deu um forte “puxão de orelhas” ao executivo de Joaquim Valente e à sua gestão, mas acabou por viabilizar a adesão do município ao Programa Extraordinário de Regularização de Dívidas do Estado (PREDE).
Em causa está a concessão de uma linha de financiamento num montante de mais de 18,6 milhões de euros, o valor da dívida de curto prazo da autarquia a 30 de Junho de 2008. Este recurso destina-se a transformar as dívidas de curto prazo a fornecedores por empréstimos de médio e longo prazo (10 anos) a contrair junto da banca (60 por cento daquele montante, ou seja mais de 11 milhões de euros) e do Estado (os restantes 40 por cento, cerca de seis milhões). Esta operação não vai aumentar o endividamento da Câmara, que ainda tem que fazer prova de que esta é a dívida real aos pequenos e médios fornecedores. De resto, as condições do empréstimo a conceder pela Direcção-Geral do Tesouro e Finanças têm condições vantajosas, já que este financiamento terá cinco anos de carência de capital e uma taxa de juro de zero por cento.
Na explanação da medida, Joaquim Valente destacou este pormenor, mas também ser esta uma forma do município ter «algum desafogo financeiro para permitir atacar outros sectores de actividade, como as obras nas freguesias já protocoladas». Mas Ricardo Neves de Sousa não foi na conversa. O deputado social-democrata classificou esta solução de «balão de oxigénio» num mandato em que «nada de materialmente relevante foi feito para resolver as dívidas de curto prazo da autarquia». E estranhou os números envolvidos, constatando que o montante do financiamento pedido fica aquém do endividamento real. «O montante comunicado à Direcção-Geral do Orçamento e Autarquias Locais ascende a 18.654.368 euros. No entanto, de acordo com o parecer do ROC [Revisor Oficial de Contas] sobre a informação financeira da Câmara no fim do primeiro semestre de 2008, aquela dívida ascendia a 22.777.190 euros», afirmou.
«”Rebuçados financeiros”»
Ricardo Neves de Sousa quis, por isso, saber quais os critérios a seguir nos pagamentos das dívidas e «quem vai ficar de fora deste “jackpot”». Avisou ainda que estes empréstimos vão reflectir-se, «em termos de custo», nos próximos mandatos, considerando que «uma gestão criteriosa, eficiente e ponderada» teria conseguido gerar «liquidez suficiente para minimizar o valor do compromisso assumido com a contracção deste empréstimo». A concluir, o deputado do PSD acrescentou que os fornecedores da Câmara «não mereciam ter estado três longos anos a sofrer os incumprimentos a nível de pagamento para agora serem brindados com estes “rebuçados financeiros”, de forte sabor eleitoralista». Jorge Noutel, do Bloco de Esquerda, seguiu no mesmo tom, notando que a dívida da Câmara da Guarda sobe «assustadoramente pela incompetência da gestão camarária». Tanto assim que, para o deputado, o recurso ao PREDE só vai fazer com que a conta do endividamento guardense «soma e segue», sentenciado que assim «hipoteca-se o futuro, comprometendo-se o presente».
Por sua vez, Honorato Robalo (CDU) pediu o valor da dívida «real e concreta a fornecedores, empresas e global» do município. Mas o presidente da Câmara remeteu-o para os documentos previsionais aprovados em Dezembro. Depois de ouvir palavras de apoio da bancada PS, Joaquim Valente sublinhou ainda que o PREDE é «extremamente positivo para liquidar dívidas a quem financiou obras públicas», afirmando que estes investimentos têm retorno. Relativamente à diferença de números referida por Neves de Sousa, o autarca justificou-a com pagamentos entretanto efectuados a fornecedores. No rescaldo deste debate, a AM deliberou, por maioria, aderir ao PREDE com os votos favoráveis de PS, PSD, CDS e BE. A CDU absteve-se, mas devido à «falta de informação», justificou Honorato Robalo numa declaração de voto.
Plano de Pormenor com gralhas
Outro assunto em destaque nesta sessão foi uma rectificação de elementos na publicação saída em “Diário da República” do Plano de Pormenor para a Zona do Mercado Municipal e Central de Camionagem, para onde está prevista a construção do Guarda Shopping Center da TCN. O assunto levou Honorato Robalo a perguntar ao presidente da Câmara se esta era uma «gralha para protelar ainda mais o projecto». Na resposta, Joaquim Valente anunciou ter sido informado pela TCN que as obras do segundo centro comercial da cidade terão início «durante o primeiro trimestre deste ano». O edil reiterou igualmente que os comerciantes do mercado municipal só mudarão para as instalações do antigo matadouro quando o espaço tiver «todas as condições para a sua actividade».
Luis Martins