Arquivo

O sucesso de “O Coveiro”

Coisas…

Fiquei muito surpreendido com o sucesso do meu escrito de há 15 dias.

Acontece frequentemente ser abordado por pessoas que comigo trabalham no hospital e que comentam ligeira e brevemente um ou outro texto que produzo. Mas a coisa desta vez bateu todos os meus modestos recordes. Confesso que passei duas semaninhas bem consolado com afagos do tipo “adorei”, “fartei-me de rir” (apesar daquilo não ter pretendido ser um texto cómico), “bestial”, “a horas!” e outros mimos do mesmo calibre. Ora, isto deu-me que pensar.

O texto abordava os esforços de um coveiro no sentido de preparar com a devida antecedência o enterramento da maternidade da Guarda; o nome do escavador não era mencionado nem provavelmente isso seria importante uma vez que o indivíduo nada tem feito para disfarçar a sua vontade de acabar com isto tudo (o “isto tudo” refere-se apenas à maternidade e ao próprio hospital; não é a cidade nem o país que, por enquanto, estão em risco; nada de alarmes). Por outro lado, durantes estes 15 dias, vi aparecer uma chusma de candidatos ao lugar de “coveiro do ano” o que coloca em perigo o herói da minha crónica anterior. Eu explico, porque gosto de explicar estas coisas.

Entre os variadíssimos comentários que fui ouvindo acerca de “O Coveiro”, houve alguns que revelavam, a par de genuína preocupação, indícios de que algo profundo e sinistro se passava nos bastidores da “saúde” da Beira Interior, assim tipo conspiração, cabala ou golpe baixo; escutei a tese uma vez, duas vezes, três vezes e passei a prestar mais atenção. Que se passaria, afinal? O problema era (e continua a ser) o facto de que a lista de candidatos ao tal título de coveiro do ano parece ser constituída por personagens muito menos interessadas em estátuas presenteadas por merdibanda de pardal do que o tal herói de há 15 dias (sabiam que “personagem” é um substantivo feminino?). Por outras palavras, há demasiada gente preocupada com o facto de haver demasiada gente interessada no encerramento da maternidade. A diferença reside em que estas personagens candidatas a enterradoras estão apostadas em colher o produto final do saque e não propriamente na duvidosa glória da abertura da cova; essa fica guardada para o mais burro e ruidoso deles todos.

Posta a coisa desta forma, conclui-se resumidamente o seguinte: a existência da maternidade da Guarda “apenas” interessa às grávidas, aos que lá trabalham e a um sem número de pessoas que gostam da sua terra e do seu hospital; o seu encerramento interessa a um sedento de glória, a uns tantos sedentos de outras coisas, e porventura a alguns covilhanenses. Mas entre aqueles que se vão seriamente preocupando com o problema, dá-lhes um jeitão que haja aqui um cronista que vá dizendo o que toda a gente sussurra.

Anuncia-se por aí uma reunião de gente que percebe destas coisas e aí algumas máscaras poderão cair. Vamos ver quem brilha.

PS: O número de textos meus já remetidos à Inspecção-geral da Saúde e à Ordem dos Médicos, acompanhando queixinhas não pára de aumentar. Quando chegar a altura de pagar as indemnizações, espero uma ajudinha por parte dos tais das palmadinhas nas costas.

Por: António Matos Godinho

Sobre o autor

Leave a Reply