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O Sabugueiro

Comentário

A original forma de protesto organizada na serrana aldeia do Sabugueiro é, em tese, uma forma de intervenção cívica merecedora de aplauso. A população saiu à rua e, com o apoio da Câmara de Seia, distribuiu flores em troca de solidariedade. Para os cidadãos do Sabugueiro (e para a autarquia senense) a estrada 339 tem de ser requalificada, têm de se criar «bolsas de estacionamento», de aproveitar as valetas, de criar um posto local de limpeza de neve e um posto da GNR, mesmo que temporário.

A justeza e pertinência das reivindicações não deveriam merecer qualquer reparo. Defender a qualidade de vida das pessoas – das que vivem na aldeia, ou no concelho, ou dos visitantes que a atravessam – é uma postura que se aplaude.

Ainda assim, há um misto de reclamação cívica pertinente com populismo, demagogia errática e algum embuste.

Eduardo Brito, mais de uma vez, veio a público defender bons acessos à Torre. Agora foram os seus seguidores e os habitantes do Sabugueiro. A melhoria do pavimento da 339 está prevista para breve, numa intervenção já adjudicada e adiada pelas condições climatéricas.

Não sendo um sem sentido, este “protesto com flores” é um pouco patético. Em vez de defenderem a preservação da natureza e do ambiente, reividica-se mais estrada. Em vez de melhor sinalização e mais segurança, clama-se por um posto de limpeza para ser usado um dia por ano.

As encostas envolventes ao Sabugueiro viram desaparecer a flora nos últimos anos, com incêndios que encarvoaram o que antes era verde. Usaram as plantas e as flores, mas não defenderam a reflorestação urgente para uma Serra onde flora e fauna têm sido esquecidos.

Muitos dos visitantes poderiam descer por S. Romão, pela antiga estrada da EDP. Esta estrada, estreita e sinuosa, de uma beleza indelével, permitiria aos turistas conhecer a Senhora do Desterro, desfrutar do verde da paisagem e ir à Cabeça da Velha. Não o fazem porque a tabuleta é sistematicamente destruída. Por quem? Quiçá por aqueles que querem que os carros continuem todos a passar pelo Sabugueiro (se até assim o «negócio está mal»!) e que reivindicam mais estacionamento à custa da natureza.

A estrada Nacional 339, entre Seia e a Torre, está ao nível da maioria das estradas de montanha de qualquer outro país, onde o respeito pela natureza seja, pelo menos, tanto como os interesses económicos. O mais caricato é que, curiosamente, a parte que está em piores condições é entre Seia e Aldeia da Serra. Este trajecto tem a berma superior completamente destruída. A Câmara de Seia ao realizar as obras para levar o saneamento básico até Aldeia da Serra destruiu a margem e deixou a faixa ascendente com o pavimento destruído…

A criação de uma consciência cívica é importante. Especialmente se for para defender o meio ambiente. O turista só virá à Serra se o ecossistema for respeitado. No futuro, mais importante do que ter boa estrada para o maciço central será ter boas condições para receber as pessoas (e isso, felizmente, já acontece). E mais importante é que a natureza seja respeitada. Alguém devia dizer isto ao senhor presidente da Câmara de Seia.

Luís Baptista-Martins

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