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O regresso da mordaça?

Menos que Zero

O Supremo Tribunal de Justiça (STJ) condenou o jornal Público pela publicação de uma notícia … verdadeira. Isso mesmo, o jornal terá de pagar 75 mil euros de indemnização porque três conselheiros do STJ consideraram que, embora relate factos verdadeiros, a notícia em causa afectou de forma negativa o crédito e o bom-nome da entidade visada. Num outro caso, a revista Notícias Magazine foi condenada, em primeira instância, pela publicação de uma notícia que se revelou igualmente verdadeira.

Estas duas decisões, especialmente a primeira por se tratar de uma instância superior, representam verdadeiros atentados à liberdade de imprensa e devem ser encaradas como graves ameaças à democracia, pois facilitam a vida aos que tentam calar a voz incómoda da imprensa. Se fizerem jurisprudência, estas decisões representam um sério revés para a comunicação social e, particularmente, para a imprensa local, pois surgem numa altura em que foi reduzida a comparticipação do Estado no porte pago, debilitando ainda mais a periclitante situação económica de muitos jornais.

A imprensa regional sabe que a publicação de notícias incómodas para alguns autarcas implica a perda de publicidade dessas câmaras, mas acredita que a defesa da verdade é recompensada com o crescimento das vendas e consequente aumento da publicidade de privados. Porém, se as decisões destes dois tribunais fizerem jurisprudência, de pouco valerá um eventual aumento das receitas, pois a possibilidade de ser condenado ao pagamento de chorudas indemnizações acaba por ter um peso maior nas contas. Naturalmente, os jornais evitarão os assuntos mais sensíveis pois, mesmo relatando factos verdadeiros, sujeitam-se a processos que em caso de indemnizações podem conduzir ao seu encerramento.

Dizer a verdade já não é garantia de coisa nenhuma. Qualquer tribunal pode considerar que o direito de um transgressor à sua honra se sobrepõe ao dever de informar, atropelando assim a liberdade de imprensa. O que é uma situação estranha num país onde ainda ontem se comemorou o dia da liberdade.

Nota: Um outro projecto de comunicação exigiu a minha atenção obrigando-me a suspender esta coluna durante algum tempo. Agora que tudo parece ter voltado à normalidade, o Menos que Zero regressa ao Interior.

Por: João Canavilhas

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