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“O Quarto de Jack”, Emma Donoghue

Opinião – Ovo de Colombo

Nascida em Dublin, em 1969, e a viver actualmente no Canadá – depois de ter passado por Inglaterra onde se doutorou pela Universidade de Cambridge – Emma Donoghue é escritora de romances históricos e contemporâneos, dramaturga, contista e crítica literária. Os seus romances incluem alguns bestsellers como “Slammerkin”, “The Sealed Letter”, “Landing”, “Life-Mask”, “Hood” e “Stir-fry”.

“O Quarto de Jack” (Room) é o seu título mais conhecido, publicado em mais de 30 países, eleito o melhor livro do ano por diversos meios de comunicação internacionais e finalista do Man Booker Prize 2010.

Inspirado em histórias recentes de sequestro prolongado, como a de Elizabeth Frizl, este é um romance intenso e comovente sobre o mal absoluto e a resiliência humana, os abismos do trauma psicológico e o poder do amor, a inocência e a descoberta.

Jack tem cinco anos e vive com a mãe num pequeno quarto secreto que constitui o seu pequeno e único universo. A existência de um mundo lá fora é-lhe completamente desconhecida: é um mundo que ele nunca viu ou experimentou. É neste espaço exíguo e claustrofóbico que ele se sente seguro e protegido, ignorando na sua inocência de criança a cruel realidade que o mantém a ele e à mãe confinados àquele espaço. Ambos são mantidos prisioneiros pelo “Velho Nick”, o homem que há sete anos atrás raptou a mãe, então com dezanove anos, e desde então a mantém em cativeiro. Jack nasceu, dois anos depois, resultado dos constantes abusos sexuais de que a mãe tem sido vítima.

A história é inteiramente narrada na primeira pessoa, pela voz do pequeno Jack, cuja linguagem e perspectiva narrativa se encontram limitadas pela sua também limitada experiência de vida, o que per si constitui, indubitavelmente, uma das originalidades deste romance. Esta estratégia narrativa é extremamente inteligente e bem conseguida, deixando muito à imaginação do leitor a percepção exacta da realidade que envolve mãe e filho, que vai muito além da visão inocente que nos é dada através dos olhos de uma criança.

Contudo, ao contrário do que se poderia esperar dada a natureza do assunto, esta não é uma narrativa que apele ao sentimentalismo ou explore o horror e miserabilismo da situação retratada. E não é preciso fazer um esforço profundo de leitura para de imediato nos apercebermos de toda uma riqueza de temas psico-filosóficos e metáforas sociais que constituem a singularidade desta obra: a privação sensorial, o desenvolvimento da linguagem, noções de sociedade, isolamento e sociopatia são algumas das “grandes questões” aqui presentes.

Pela abordagem inteligente de temas que a todos dizem respeito, este é um livro também dirigido a um público mais jovem (vem aliás recomendado no programa de português para uma leitura orientada na sala de aula), e que certamente não irá deixar ninguém indiferente.

Cristina Caramujo*

*Licenciada em Línguas e Literaturas Modernas pela Universidade de Coimbra

**A autora optou por escrever de acordo com a antiga ortografia

Sobre o autor

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