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O processo de Kafka (sem F)

Observatório de Ornitorrincos

Santana Lopes ameaçou processar as empresas de sondagens que prevêem uma derrota estrondosa do seu PPD/PSD a 20 de Fevereiro. Uma megafraude, disse o primeiro-ministro. Depois das facadas nas costas, dos pontapés no berço, das estaladas na cara e de uma dose de batatas mal passadas, para apoquentar o primeiro-ministro só faltavam maldosas empresas de sondagem e estudos de mercado a divulgar resultados enganadores. Estas empresas, como se sabe, inventam várias coisas para chatear o primeiro-ministro, desde sondagens que dão 15 pontos percentuais de vantagem a José Sócrates até barómetros que dizem que os portugueses também gostam de colo, mas não falam nisso em público. Se a ideia de Santana pegar, os advogados portugueses vão passar a ser poucos para todos os pedidos de processos por “fraude” que ficam à disposição de todos os cidadãos. Hordas de cinquentões a accionar laboratórios por causa de análises sanguíneas alarmistas, campistas de fim-de-semana a pedir indemnizações aos serviços meteorológicos por previsões menos solarengas, adeptos do Braga em tribunal contra todos os comentadores que dizem que a equipa minhota “não vai lá” e até noivos a processar furiosamente os amigos que lhes dizem que “com o feitiozinho dele/a, esta merda não dura muito”.

O primeiro-ministro está demissionário e faz tudo para convencer o povo que também está de missionário. No entanto, é Francisco Louçã, um caramelito com vocação de carmelita, que deseja ser o sacerdote da missão. A política em Portugal é uma cubata e o Bloco de Esquerda vai chegar para mudar, limpar, modernizar, purificar e esterilizar a política. Há temas que só com autorização do senhor padre Louçã se pode falar. Conversas que só com a concordância da irmã Drago se podem ter. Ideias e conceitos que sem a anuência sábia de mestre Fazenda não se podem sequer pensar.

Esta campanha tem sido fértil em promessas de “choques”. O choque tecnológico de Sócrates, o choque de gestão de Sarmento, o choque de valores de Portas. Só cá falta Alvin Toffler e o choque do futuro (como as outras, uma ideia de 1970). Os portugueses, se bem os conheço, estão todos à espera de quem lhes prometa um cheque.

EU VI UM ORNITORRINCO

O Interior

Este jornal comemorou no número anterior os seus cinco anos de vida. Segundo a teoria freudiana, o jornal abandona agora a fase fálica, durante a qual se concentrava essencialmente na zona genital, com recurso constante à masturbação e ao acariciamento, o que no caso de um amontoado razoável de folhas de papel pode causar alguns problemas com o resto das pessoas. Esta fase passou por pretender mudar o mundo (ou a cidade), manter articulistas peneirentos que não escrevem sobre cinema na penúltima página e guardar todas as fotografias de fãs incondicionais do jornal em biquini e topless numa gaveta a que poucos temos acesso. Agora, e até à puberdade, espera-se um jornal onde as pulsões sexuais sejam suprimidas para dar lugar à concentração em outros aspectos da vida, absorvendo o mundo à sua volta. O Interior será com certeza um jornal mais crescido. O leitor agradecerá convenientemente o facto quando a direcção perceber que colaboradores imberbes e reprimidos, cujo primeiro pensamento sobre qualquer assunto são as teorias sexuais de Freud, já não têm lugar em jornais adultos e responsáveis.

Parabéns.

Por: Nuno amaral Jerónimo

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