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O pão de ontem

Bilhete Postal

A crise acabou-me com o pão do dia. Esse petisco do pequeno-almoço obriga a regressar à torrada. O pão de ontem é tão bom como o pão fresco, desde que leve uns apertos de calor. O pão fresco é uma fantasia que revela como somos permissivos a adjectivos empregues erradamente. Fruta é fresca, peixe é fresco, pão diz-se fresco se feito no dia. Mas o peixe é fresco porque chega no gelo, do dia é que ele não é. E a fruta nunca foi colhida naquele dia. Porquê insistir no pão do dia? Há que dar pão às tostas e assim é sempre bom de barrar. A crise obriga-nos a abdicar da padeira. Pão fresco é mais caro que pão trazido de tarde, da padaria da esquina. Claro que a tosta não se pode fazer, ou a luz torna o pão de ontem mais caro que o fresco. Então comam pão de ontem com doce, que sabe a pão fresco com doce. Não? Ponham mais doce e saberá a doce e esqueçam o pão. A crise obriga a pensar na toleima da fiscalização que manda deitar fora o pão de ontem, quando em casa dos fiscais o pão só se rejeita com bolor. Com bolor o pão é Camembert. Põem-se um presunto e sabe a “tostada Catalana”. As leis extremas de pureza alimentar diminuem a diarreia e aumentam a fome e o desperdício. A comida que se rejeita hoje é quase uma ofensa aos que não comem pão fresco. Temos muito que repensar nos próximos tempos e sobretudo, muitos técnicos de Bruxelas para mandar para casa, com os salários que verdadeiramente merecem e voltarem a comer pão de ontem.

Por: Diogo Cabrita

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