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O mundo tal e qual não o vemos

Três documentários sobre a diversidade natural e humana na Mediateca VIII Centenário, na Guarda

O cinema naturalista está de regresso à Mediateca VIII Centenário, na Guarda, que na próxima semana dedica três sessões a um género documental que explora os limites da imagem pura. Um experimentalismo radical feito unicamente de imagens e sons para que seja o espectador a dar sentido ao que vê em “Baraka” (1993), “Animal Mundi” (1996) e “Microcosmos” (1996). Três filmes na linha da Trilogia Qatsi, já exibida na Mediateca, que apresentam um olhar desconcertante sobre a diversidade natural e humana do planeta revelando um mundo nunca antes visto graças ao último grito da tecnologia cinematográfica e a uma montagem inovadora.

Este movimento marginal do cinema documental surgiu na década de 80 e aposta na eliminação de todos os elementos narrativos do filme, que acusam de ter transformado o género numa variante da ficção. Realizadores como Ron Fricke e Godfrey Reggio, os mais destacados, “apagam” então a narração, a presença de um personagem e a tradicional estrutura narrativa, para fazer sobressair a imagem pura, a música e os sons, três elementos combinados de forma extremamente estimulante para os sentidos. Paralelamente, usam rápidos movimentos de câmara, longos planos-sequência, imagens hiper-aceleradas ou em super-slow-motion, entre outras técnicas inovadoras. O objectivo é deixar o espectador assimilar o que vê e produzir as suas próprias leituras sem qualquer intermediação. “Baraka”, de Ron Fricke, em cartaz na segunda-feira à noite, é disso exemplo. Filmado em 24 países, propõe uma fascinante viagem visual e musical pela diversidade natural e humana do planeta Terra. Tudo num formato 70 mm TODD-AO – esta produção custou quatro milhões de dólares – e com recurso a métodos inovadores, nomeadamente uma câmara controlada por um computador que permitiu os inacreditáveis planos acelerados da Park Avenue de Nova Iorque em hora de ponta e no sobrelotado metro de Tóquio.

Também “Anima Mundi”, a exibir terça-feira, e “Microcosmos” são um viagem extraordinária pelos mistérios do planeta. O primeiro, do realizador Godfrey Reggio, é um desconcertante documentário musical (a banda sonora é de Philip Glass) sobre o mundo animal e a sua relação com o homem e a natureza. Verdadeiramente surpreendente é o último filme deste pequeno ciclo. Programado para quarta-feira, “Microcosmos”, da dupla francesa Claude Nuridsany e Marie Pérennou, mostra que não precisamos da ficção científica para descobrir figuras extraterrestres e universos desconhecidos. Eles convivem diariamente connosco, basta dar-lhes um pouco mais de atenção, usar um sistema de filmagem Macrovision e câmaras especialmente adaptadas para entrarmos no fantástico e inimaginável mundo que grassa numa pradaria em pleno Verão. O resultado é uma mistura nunca vista de romance, humor e erotismo, filmado à escala milimétrica, em que os insectos se transformam em criaturas fantásticas e as ervas parecem florestas impenetráveis. É a vida tal como ela acontece todos os dias.

Luis Martins

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