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O Memorando

Editorial

1. O Memorando produzido pela Troika é efetivamente o verdadeiro programa de Governo que, quem ganhar as próximas eleições, irá ter de aplicar. O que os políticos deviam estar a discutir era este programa de Governo imposto pelos credores. Tudo o mais é conversa fiada e tempo de antena obtuso.

Mais. Era importante que os candidatos a governantes clarificassem como é que irão implementar um conjunto de medidas definidas pelo FMI, CE e BCE. Na prática, só houve um ponto devidamente discutido – a redução da taxa social única às empresas, para incentivar a criação de emprego, e que, no meio de tanto ruído, ninguém percebeu muito bem. Na generalidade tudo o que foi contratado com quem nos vai emprestar os 78 mil milhões terá de ser cumprido, mas ninguém o explicita, porque é mais simples continuar a falar do PEC IV ou do Drácula.

Entre as medidas plasmadas no Memorando está, como muitas vezes já foi publicitado, a extinção de cerca de 40 por cento das autarquias. Como o assunto foi retirado da campanha, (talvez por não dar jeito fazer um comício numa localidade e no final despedirem-se com um adeus ao estatuto de município ou de freguesia…) fica a ideia que nenhum dos partidos quer discutir este ponto por o considerar como um dado consumado. Mas o cidadão tem o direito de saber. De saber, por exemplo, quantos concelhos serão extintos na região e quantas freguesias serão eliminadas? E extinguindo alguns concelhos da região, como é que vai ser administrado o vasto território, pobre e já hoje ostracizado, que irá ficar ainda mais abandonado? Sem Câmaras Municipais que vida poderá haver para além das autoestradas que levam e só trazem nas romarias de verão? Que futuro podem ter nas aldeias aqueles que já hoje estão abandonados, mas que sem juntas ou câmaras ficarão mais débeis? É verdade que tem de haver uma reforma administrativa. É verdade que têm de ser eliminadas juntas de freguesia em aldeias onde só ficaram umas dezenas de resistentes. É verdade que há municípios que podem ser fundidos com outros e, com menos custos, melhorar a gestão do território. Mas por que razão quando se comenta o assunto toda a gente se vira para o interior? Porque será? Só a densidade populacional pode contar para determinar a manutenção de autarquias?

2. O candidato a deputado e cabeça-de-lista pelo PS vai ficar no anedotário desta campanha. A frase “Sócrates é fixe” repetida meia-dúzia de vezes por um Paulo Campos aos saltos foi um momento patético. Tentar recuperar um slogan que assentava como uma luva a Mário Soares e introduzi-lo nesta campanha em defesa de um Sócrates irascível, mais conhecido por ser um “animal feroz”, que odeia ser contrariado e que espalha azedume por onde passa, foi inesperado, mas permitiu, pelas piores razões, uma nova popularidade ao secretário de Estado das portagens, que se esqueceu que “fixe” era mesmo Soares, e só Soares. A jovialidade e veemência traíram um Paulo Campos entusiasmado e nervoso, a quem faltaram palavras e argumentos para melhor intervenção. Os próximos dias mostrarão se recupera a tranquilidade, o vigor e a disponibilidade na defesa dos interesses da região ou se entrará no ocaso dos socialistas.

Luis Baptista-Martins

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