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O lugar da memória

Mais de uma centena de peças no primeiro museu judaico do país, em Belmonte

A memória tem um lugar em Belmonte e materializa-se em mais de uma centena de peças e de nomes, patentes no primeiro Museu Judaico do país. Inaugurado no último domingo, o espaço pretende colmatar «os anos de ausência pública» do judaísmo em Portugal, sublinhou o rabino Elisha Salas, realçando a particularidade dos objectos expostos serem mostrados pela primeira vez. Numa cerimónia marcada pelo reencontro com um passado escondido, o ministro dos Assuntos Parlamentares, Augusto Santos Silva, garantiu que os judeus de Belmonte «não são uma curiosidade histórica», antes um «elemento vivo» da liberdade.

Valor universal que custou muitas vidas na Beira Interior durante a Inquisição, como recorda um memorial patente no museu com mais de 200 nomes, entre os quais se destaca o da pequena Inês Nunes, de 14 anos. O historiador Adriano Vasco Rodrigues considerou a propósito que o Tribunal do Santo Ofício foi «o pior inimigo do cristianismo», enquanto Jorge Patrão, presidente da Região de Turismo da Serra da Estrela, disse ter chegado a altura de homenagear «aqueles que resistiram aos crimes da História e às asneiras deste país». Por isso, cada peça é um pedaço da memória do judaísmo em Portugal cedido por Adriano Vasco Rodrigues, pelas famílias Carqueja Rodrigues, Matos Domingos, Morão, Henriques e pela comunidade judaica de Belmonte, entre outras. O museu apresenta peças de culto, domésticas e rituais hebraicas, sobretudo da Beira Interior e Trás-os- Montes, com destaque para o rolo do primeiro Sefer Torah (Lei Hebraica) de Belmonte, um conjunto monetário hebraico encontrado em Mértola em 1968 no decurso da demolição de um muro antigo, presumivelmente de uma habitação datada de 06 a 09 d. C.. Há também uma Hanukiah (candelabro de nove braços) do século XV, uma estela funerária (réplica) encontrada em Mértola, a réplica da inscrição hebraica em granito da antiga Sinagoga de Belmonte, datada de 1297, e indumentária religiosa utilizada nas diferentes festas judaicas (Páscoa, Purim, tabernáculos, Luzes, etc).

A autarquia investiu cerca de um milhão de euros na recuperação do antigo Colégio de Belmonte, comparticipados em cerca de 70 por cento pela Acção Integrada de Base Territorial (AIBT) da Serra da Estrela. Para além do museu, o edifício acolhe um pequeno auditório e o Centro de Estudos Judaicos Adriano Vasco Rodrigues. Segundo o presidente da RTSE, são esperados entre 50 a 60 mil visitantes este ano, mas há um mercado potencial de cerca de 17 milhões de judeus de descendência sefardita, isto é com origem de Portugal e Espanha. Lembrando a Rota das Judiarias, Jorge Patrão lembrou que este é um recurso «altamente atractivo» para os descendentes de Sefarad e anunciou o desejo de organizar no próximo ano na região um grande congresso mundial de judeus sefarditas. Já o presidente do município, Amândio Melo, classificou o museu de elemento pedagógico de «extrema importância», enquanto Augusto Santos Silva garantiu que «o Portugal democrático conhece muito bem a experiência dos judeus». Estiveram também presentes representantes das comunidades judaicas de Guarda, Lisboa e Porto, da Embaixada de Israel, autarcas dos municípios em que a presença judaica foi importante, historiadores e empresários, alguns de raiz familiar judaica. A cerimónia ficou ainda marcada pelo lançamento do livro de David Canelo, “O Resgate dos Marranos Portugueses”.

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