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O inevitável

“Parecia que aqueles antigos pensavam que as declarações da verdade absoluta eram um reconforto. Que curiosa combinação de vitalidade e passividade eles eram! Teria sido assim, na alvorada da história registada? Quando as pessoas pressentiam o inevitável, ficavam imóveis e o aceitavam?”

Anne Rice em “Rainha dos Malditos-II”

O mundo é uma pedra branca e suja sobre a qual vários mares se debruçam, um calhau rolado pelas areias do universo, escavado a azul em três quartas partes e enrugado a castanho e verde no quarto restante.

Várias leis físicas regulam o seu equilíbrio. Umas são conhecidas. A gravidade, os campos magnéticos, a expansão do Universo, a deslocação e rotação galácticas, o vento solar. Outras não.

Sobre este calhau vivemos muitos seres que temos em comum a notável transitoriedade da nossa existência. Homens, árvores, avestruzes ou cogumelos somos todos, do ponto de vista cósmico, exactamente iguais, pequenos pontos negros à superfície dum descampado.

Quer nos mexamos sobre dois ou quatro membros, quer estejamos presos à terra por troncos e raízes, todos precisamos do mesmo para sobreviver. Da sucessão dos dias e das noites e das estações do ano, da chuva, do vento, do sol e do escudo estratosférico.

Independentemente da nossa vontade, a Terra está sujeita a um padrão de variação climática, que resulta de ciclos na sua rotação, inclinação e órbita, conhecidos desde os anos 20. A última glaciação ocorreu há 18 000 anos. Estamos, há 10 000 anos, numa fase quente. Dentro de mais alguns milhares, estaremos a caminhar para um novo período glaciário.

George W. Bush, na sua global e iluminada visão dos destinos do mundo, percebeu que só a manutenção dos níveis de emissão de CO2 e do efeito de estufa impedirá o arrefecimento. Quando este começar, Nova Iorque ficará soterrada sob um lençol de gelo de 400 m de altura e, devido ao recuo dos mares, poder-se-á ir a pé de Inglaterra até à França.

O Presidente não é parvo nem egoísta como muitos querem fazer crer. Ele pensa, sempre, nos interesses superiores do planeta e, só por isso, se recusa a aderir ao protocolo de Quioto. Aqui entre nós, sabem o que acontecerá ao Japão no próximo período glaciário? Transformar-se-á numa península da Ásia… E os chineses são muitos, além de que têm uma tradição imperial.

Claro que não há bela… sem senão.

Se o planeta não arrefece, aquece. Porque ao aquecer, pode ser que arrefeça menos para os que sobreviverem. Seja como for, estamos condenados.

De forma que, com a nossa ajuda, fiéis aliados que somos, grandes consumidores de coca-cola, ice-tea e cerveja de lata que lançamos pela janela do carro e do comboio, juntamente com as piriscas e os invólucros dos maços de cigarros e dos pacotinhos de lenços de papel, ferozes adeptos do papel higiénico cor-de-rosa com florzinhas em detrimento do reciclado que é branco-sujo e menos macio, consumidores de madeiras tropicais em menoscabo dos abetos, pseudo-tsugas e cupressos das reflorestadas matas de coníferas do Norte da Europa, hão-de fornicar isto tudo, enquanto o diabo esfrega os dois olhos de espanto.

Um manto, negro ou branco, irremediavelmente, nos espera.

Adeus, até à tumba.

Por: Maria Massena

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