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O “desabandono” do interior do país – A Cidade de Pinhel

Opinião

Muito se tem falado ao longo dos anos, do abandono e despovoamento do interior do país, justificado, em primeiro plano, pela falta de ofertas de emprego e, em segundo plano, pela inexistência de acesso à cultura ou à variedade na educação dos filhos enquanto crianças. Não pode ser negado que sair da cidade, da vila ou da aldeia que nos viu nascer, contactando com diferentes visões e realidades, é extremamente enriquecedor. Contudo, será assim tão verdade que essa saída “em busca de uma vida melhor” seja realmente melhor? Poder-se-iam enumerar diversos aspetos que dão ao interior uma enorme vantagem, como a tão falada qualidade ambiental, ou não desperdiçar horas da vida diariamente parados no trânsito para levar os filhos à escola ou ao voltar do trabalho para casa. Outro aspeto, muitas vezes ignorado, é que esta mudança é feita normalmente para grandes cidades onde o custo de vida é excessivamente elevado e, por vezes, o ordenado não é suficiente nem para as necessidades mais básicas. No interior do país, o custo de vida é muito menor, podendo com o mesmo ordenado haver uma melhor qualidade de vida, sendo possível proporcionar à família um maior conforto no presente e mais possibilidades de escolhas no futuro. Não será este um importante aspeto para cativar não só os que já habitam no interior para não o abandonarem, mas sobretudo cativar novos cidadãos que possam aqui investir, aumentando assim as ofertas de trabalho?

A cidade de Pinhel, uma cidade também do interior, contraria o “criticismo” da interioridade parada e trivial. É notória a aposta no melhoramento da cidade, quer a nível de infraestruturas, como nas ofertas culturais e distintas atividades, fator importante na permanência dos pinhelenses e na atração de novos cidadãos. A requalificação urbana, ainda em curso, na zona centro da cidade está a modernizar completamente este núcleo, tornando-o mais amplo e mais acessível, não alterando contudo as caraterísticas arquitetónicas e históricas, de intrínseco valor. Também a recente recuperação do antigo edifício do Paço Episcopal e posterior inauguração como Casa da Cultura e Museu José Manuel Soares, juntamente com o património arquitetónico ímpar e de relevante riqueza, são mais um convite a visitantes que, pouco a pouco, farão a economia da cidade mexer.

A nível cultural Pinhel possui o que se pode designar de “agenda cheia”, com inúmeras atividades, peças de teatro, cinema, feira do livro, conferências, com particular destaque para o ciclo “Museu à Noite”, evento realizado uma vez por mês no Museu José Manuel Soares, trazendo convidados de vários pontos do país para debate de temas ligados à arte e à cultura. Também na educação há uma oferta diversificada de atividades, desporto, música, dança, sendo possível um contacto direto desde a infância com diferentes formas de expressão. A própria Feira das Tradições contraria a tese de um interior sem vida, sendo visitada num só fim-de-semana por milhares de pessoas. Todos estes aspetos são uma mais-valia quando se fala em qualidade de vida. Todos eles geram empregabilidade. Estará o interior realmente entregue ao abandono ou começa a ser, pouco a pouco, invertida a situação e a “desabandonar-se” esta parte do país?

Por: Joana Correia Saraiva

* Arquiteta e artista plástica

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