P – Em cinco jogos no campeonato da Liga de Honra, o Sporting da Covilhã conseguiu cinco pontos. Esperava ter mais nesta altura?
R – Quando cheguei, procurei, dentro do quadro que me foi apresentado, estabelecer algumas prioridades. Uma foi devolver a cidade ao seu clube e o clube à cidade. Sentia que havia algum distanciamento entre as pessoas e o clube. Para mim, seria um objeto de resolução quase imediata procurar fazer com que as pessoas começassem novamente a identificar-se com o futebol da sua cidade através do Sporting da Covilhã. Outra prioridade foi estabelecer que a Taça da Liga era muito importante para o clube e fizemos uma análise fria que, eventualmente, íamos estar muito bem nessa competição, mas poderíamos pagar posteriormente uma fatura se não tivéssemos a felicidade de ganhar um dos primeiros jogos do campeonato. Resolvi arriscar porque a parte financeira está sempre ligada a estes clubes e a Taça da Liga é um objeto apetecível se as equipas conseguirem passar algumas fases e, mais importante que a parte inicial do campeonato, preocupei-me mais com esses aspetos. Um terceiro pormenor importante para mim era passar uma imagem de futebol de qualidade e agradável. Como cômputo geral, antes de começarmos o campeonato, esses três pontos estavam completamente preenchidos. Respondendo à questão, atendendo aos jogos que fizemos, cinco pontos são, sinceramente, muito poucos para o que produzimos. Na minha ótica, se tivesse entre oito e 10 pontos estaria satisfeito.
P – Neste momento, já defrontou vários adversários e tem um maior conhecimento da real valia de outros. Até onde pode chegar a equipa que treina?
R – Este campeonato é e será sempre muito equilibrado. Acho é que existem algumas situações que podem marcar o Covilhã. A primeira é a distância enorme que vamos ter em termos de viagens relativamente a alguns adversários. Só o Portimonense é que está pior do que nós neste aspeto e isso, nesta maratona, pode deixar marcas em qualquer equipa. Espero ter a capacidade de gerir bem esta condição porque, senão tivermos esta contrariedade do desgaste físico, temos condições para fazer um campeonato de grande qualidade. O clube tem estabilidade diretiva e financeira e isso já é uma grande vantagem sobre muitas equipas.
P – A entrada das equipas “B” poderá colocar em causa a verdade desportiva do campeonato, com a eventual chamada de jogadores das equipas “A”?
R – Acho que as equipas “B” são bem-vindas ao futebol português, fruto de uma aposta mais precisa em jovens atletas. Esse é o caminho que faz com que muitos jovens não desapareçam e é muito importante estarem a trabalhar perto das equipas “A” do Sporting ou Benfica, por exemplo. Agora, em determinadas alturas, passa a ser uma mentira nós defrontarmos equipas que, se calhar, outros não defrontam. Nunca sabemos quem fica em vantagem. Nós, em cinco jogos, jogámos com duas equipas “B”. A do Guimarães apresentou vários jogadores que fazem parte da equipa “A” e a do Sporting não e manteve uma situação muito similar ao que fez em todos os jogos. Quando estiverem aflitos, em qualquer altura podem meter outros jogadores. Nesse sentido, não têm um plantel similar ao nosso. Em vez de 24 ou 25 jogadores podem ter 35 ou mais se não ultrapassarem a idade permitida. Contudo, antes de começar o campeonato, as restantes equipas já sabiam dessa situação, portanto não utilizo muito essa desculpa.
P – No fim do último jogo para o campeonato fez questão de agradecer o apoio e o carinho que tem tido por parte dos adeptos. Está surpreendido com essas manifestações?
R – Não estou surpreendido porque quando estive há dois anos em Tondela, e vivi relativamente perto desta zona, já tinha sentido esse apoio e pude ajudar a crescer um clube que nunca tinha lutado por objetivos um pouco mais além, como tivemos nesse ano. Tinha ouvido falar sempre muito bem dos adeptos do Covilhã, sabia da paixão destas pessoas pelo futebol e do seu saber receber. A partir do momento em que começámos a fazer uma boa pré-época e a demonstrar futebol de alguma qualidade, as pessoas ainda sentiram mais isso e deram mais carinho ao treinador.
P – O sorteio da Taça de Portugal colocou o Cinfães no caminho do Covilhã. Quais as suas ambições nesta prova?
R – Temos um problema grave que é o de eu não conseguir fazer muitos milagres em tantas competições e a Taça de Portugal também é uma prova prestigiante, que temos que respeitar. Às vezes existem questões que nos podem prejudicar em termos do momento em que fazemos o jogo. Neste caso, jogamos domingo com o Cinfães, quarta na Madeira com o Marítimo B e no domingo seguinte recebemos o Arouca. Isto, quando o Marítimo não joga para a Taça e o Arouca não joga na quarta, pois antecipou o jogo com o Sporting “B” para domingo. Ou seja, numa semana fazemos três jogos e eles só fazem dois. Se não tivesse este tipo de situações, a Taça seria mais fácil de gerir. Às vezes, os jogos surgem em alturas em que temos que equacionar se apresento a nossa melhor equipa ou vou fazer descansar a maior parte dos jogadores, mas quero ir longe na Taça de Portugal, que, por vezes, também é uma montra e há treinadores e jogadores que conseguem valorizar-se nessa competição. Dou o exemplo do último treinador que entrou na Iª Liga, o Paulo Fonseca, que chegou lá porque fez duas boas campanhas na Taça com o Pinhalnovense. Nós, treinadores, vivemos muito dos resultados e às vezes uma boa campanha na Taça também nos pode dar algo mais do que o que estamos à espera.
P – O resultado obtido contra a Académica para a Taça da Liga abre boas perspetivas para o segundo jogo?
R – Cada jogo tem a sua história. Este foi só a primeira parte e temos de estar preparados para o que vamos encontrar na segunda. A Académica sentiu a valia dos nossos jogadores, que estiveram a um nível fantástico, mas sabemos de antemão que a nossa tarefa em Coimbra vai ser muito complicada, pois a qualidade da equipa técnica e do grupo de trabalho do adversário vai-nos criar muitas dificuldades na segunda mão. É certo que uma vitória por dois golos de diferença e sem sofrer golos é importante e abre boas perspetivas de apuramento, mas não nos podemos esquecer que o favoritismo continua a ser da Académica. Contudo, acredito nos meus jogadores e nesse jogo vamos tentar ser iguais a nós próprios, demonstrando respeito, mas procurando contrariar novamente esse favoritismo de modo a alcançarmos um resultado que nos permita seguir em frente.
P – Nunca treinou na Primeira Liga. Tem esse objetivo?
R – Tenho muitos mais objetivos para além disso. Tenho 27 anos como treinador e, às vezes, ainda sinto que estou a começar a minha carreira porque tenho 48 anos e quero chegar a um patamar bem alto do futebol português. Quero ultrapassar algumas fronteiras, não quero só trabalhar na Iª Liga. Quero também trabalhar no estrangeiro e viver experiências novas. Sempre disse que queria atingir determinado tipo de patamares, consegui atingir alguns, mas penso sinceramente que estou um pouco atrasado relativamente aos objetivos que já tinha perspetivado há algum tempo. Por isto e por aquilo não consegui chegar mais cedo à IIª Liga, embora já tenha treinado há uns anos o Santa Clara neste campeonato. Acho que devia ter dado continuidade a isso. Perdi-me um pouco nessa altura em termos de opções clubísticas que não foram boas para mim. Demorei um bocado a chegar outra vez e espero que este seja o pontapé de saída para poder atingir um tipo de patamar de que acho que posso fazer parte.
P – Iniciou a carreira de treinador aos 20 anos nos seniores do clube da sua terra, o Ericeirense. Como surgiu essa oportunidade?
R – Surgiu porque, infelizmente, tive um problema de saúde gravíssimo e disseram-me que durante dois, três anos não podia praticar desporto e mataram-me esse sonho, eu que era louco por futebol e por jogar futebol. Na altura disse que não aguentava tanto tempo e então tirei um curso de treinador dos 19 para os 20 anos. O clube da minha terra estava prestes a desaparecer e de repente arranjei um conjunto de ideias, tendo obrigado as pessoas a não deixarem que terminasse. Essas pessoas entenderam depois que precisavam de alguém que não ganhasse nada para treinar a equipa e escolheram-me. Comecei a treinar com 20 anos de forma graciosa, defendendo o clube da terra e comecei aí a minha carreira.