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O consumo de bolota entre os Lusitanos

Nos Cantos do Património

Entre os vestígios das aldeias da Idade do Ferro – do século VIII antes de Cristo até à conquista romana do território – encontramos, também, bolotas carbonizadas. Junto à povoação dos Galegos, na Guarda, descobriu-se há poucos anos os restos de um “povoado de fossas” datado do século V a.C., o único descoberto na Beira Interior até ao momento (vide O Interior de 30-10-2003). Este período, ficou marcado indelevelmente pelo Lusitanos, povo que habitou grande parte da actual Beira Interior mas sobre o qual quase tudo se desconhece. O pouco que sabemos foi-nos transmitido pelas fontes clássicas latinas, mas já numa época tardia. Com efeito, as informações que os autores latinos remetem-se ao período dos primeiros contactos entre romanos e lusitanos, no século II a.C..

No povoado sui generis do Picoto (Galegos, Guarda), descoberto ocasionalmente e escavado de emergência devido ao eminente risco de destruição, foram descobertas diversas “fossas” escavadas no saibro. Essas cavidades, de dimensões muito variáveis, serviram para armazenamento de produtos alimentares, sobretudo bolotas carbonizadas. Junto dessas cavidades ou silos descobriram-se vestígios de antigas lareiras onde se identificaram muitas bolotas carbonizadas ou torradas que, depois de analisadas e datadas pelo C14, nos permitiram confirmar a utilização das fossas no século V antes de Cristo. Assim, pressupõem-se que as populações que ali viveram não dispensavam a bolota na sua alimentação diária. Este fruto silvestre podia ser recolhido em torno do povoado, não sendo necessário muito esforço para obter um bom fornecimento deste alimento.

A bolota teria, igualmente, grande significado na alimentação do gado que sustentava esta população da Idade do Ferro. Alimentava, sobretudo, os porcos cujas representações em pedra abundam na antiga área dos Vetões – vizinhos dos Lusitanos – que habitavam a região de Salamanca e de Ávila. Estes animais teriam um elevado valor económico, mas também simbólico, para as populações pré-romanas da antiga área dos vetões como das populações que viveram na actual região de Trás-os-Montes. As imponentes estátuas de granito, em tamanho real, como as que se podem observar à entrada da aldeia histórica de Castelo Mendo, perpetuaram para sempre o valor simbólico desses animais. Nesta histórica aldeia do Côa os “berrões” ou “verracos”, colocados à entrada do recinto fortificado, ostentam ainda algumas marcas simbólicas como as “covinhas”, pequenos covachos escavados no lombo. Mas há também sinais de vandalismo. Segundo a tradição, a população terá partido o focinho a cada um dos berrões porque estes “assustavam o gado”.

Em Santo André, freguesia de Almofala, concelho de Figueira de Castelo Rodrigo, os outros dois “berrões” conhecidos em Riba Côa guardam a entrada do recinto da actual capela construída sobre as ruínas de um povoado da Idade do Ferro e, posteriormente, aldeia romana.

Por: Manuel Sabino Perestrelo

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