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O candidato certo

Depois de audições e quatro votações secretas entre os 15 membros do Conselho de Segurança, António Guterres, o engenheiro cristão que governou dentro de fronteiras com a paixão da educação, e fez fora de fronteiras da capacidade de diálogo uma força de mediação crucial enquanto alto comissário para os refugiados, posiciona-se como o candidato favorito à eleição para Secretário-Geral da Organização das Nações Unidas.

No próximo dia 26 terá lugar mais uma votação que talvez não seja tão favorável a Guterres quanto as anteriores. Resistências começam agora a fazer-se sentir com rumores de novas candidaturas, um pouco à má fila, indo já bem adiantado o processo de escrutínio e auscultação previamente acordado. Mas também com candidaturas que, apesar de não terem convencido ninguém, não dão sinal de ceder, impedindo que se alcancem progressos num processo diplomático delicado de circunscrição dos candidatos. A este quadro nada ajudam as recentes trocas de acusações entre representantes do governo alemão e do governo russo.

Apoiar a eleição de Guterres não é torcer por um português. Isso funciona nos jogos olímpicos e no futebol, mas não na política, pelo menos levada a sério. Basta lembrar o lamentável caso do nosso concidadão que presidiu por uma década à Comissão Europeia para, no fim, alcançar – pasme-se – o topo da vida empresarial, como bem congratulou o Presidente da República. Já sabemos que Durão Barroso deixará de ser recebido pela Comissão que presidiu com a dignidade de um ex-Presidente, mas apenas como representante de interesses, os mais fortes interesses financeiros a nível global – como um lobista, como ele próprio escolheu.

Apoiar Guterres para Secretário-Geral das Nações Unidas pela mera razão de ser português só não é definitivamente tolo porque gostaríamos, por brio nacional, de deixar uma imagem de liderança diferente da que deixa Barroso. Mas seria inteiramente deslocado levar longe essas razões. As de fundo são outras. Desde logo uma dedicação consequente, que não se deixa tentar por honras e remunerações, precisamente a contra-imagem de Barroso. Ou não tivesse António Guterres prescindido de ser candidato presidencial já em vista desta sua candidatura e da seriedade como a encara.

Guterres é, de facto, a pessoa certa para liderar a ONU porque tem a experiência de uma década à frente do ACNUR (Alto Comissariado das Nações Unidas para os Refugiados), intervindo numa área em que a Europa vive, desde os últimos anos, em iminente risco de calamidade. A verdade é que as deslocações maciças de refugiados e migrantes, mais do que crises, são a realidade permanente, de rosto desumano, da era global em que viveremos por muito tempo.

Por: André Barata

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