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O Bronx em Campolide

Lisboa e o país assistiram pela televisão ao desfecho de um assalto com sequestro como os que se vêem nos filmes de acção. Saldou-se na libertação dos sequestrados. Depois de goradas negociações de horas e horas, as forças especiais da PSP aproveitaram um momento de exposição dos assaltantes, que podia nunca mais se repetir, para atacar quando eles se preparavam para tentar fugir com os reféns.

Um êxito retumbante, uma operação quase heróica, gritaram os “media” em uníssono, quase se esquecendo de que tinha havido uma morte e de que a morte não deve ser celebrada, mesmo se dela resulta a libertação de outras vidas. Mas, logo a seguir, veio um refluxo de dúvidas e insinuações que, objectivamente, acabaram por questionar o comportamento da polícia. Fosse pela nacionalidade dos assaltantes, fosse pela decisão de atacar naquele momento, fosse pela eficácia do primeiro tiro e pelo choque emocional que ele desencadeou, houve quem se aplicasse num esforço de crítica velada. Como se o êxito da operação policial tivesse, afinal, sido um erro clamoroso.

Ora, o passado das forças de segurança em operações deste tipo não autoriza a insinuação de que foram apressadas no gatilho. Já houve vários sequestros e todos tiveram desfechos pacíficos. Se isso não aconteceu desta vez foi certamente porque as circunstâncias do assalto e o comportamento dos assaltantes não o permitiram.

Desconfiar em primeiro lugar da polícia é uma reacção quase pavloviana de certos sectores à esquerda, incluindo nos “media”. Mas o que esta e as anteriores operações similares demonstram é que a polícia sabe agir com ponderação e bom senso e também com determinação e firmeza, usando a força quando não tem outro recurso para cumprir a sua missão. E a sua missão, naquelas circunstâncias particulares, era salvar os reféns e impedir o assalto. Uma coisa é lamentar a morte de um dos assaltantes, outra é andar à cata de pretextos para, como de costume, tentar crucificar a polícia.

De quatro em quatro anos, o drama repete-se. Nas semanas que antecedem os Jogos Olímpicos, os oráculos e os especialistas de todas as especialidades fazem contas às medalhas que vamos ganhar. São sempre muitas mais do que aquelas que o comum dos cidadãos se atreveria a imaginar. Depois, começam as provas e as medalhas não aparecem. Seguem-se as desilusões, as queixas, as acusações. E a decepção geral, dos atletas e do país.

O comum dos cidadãos nunca se atreveria a imaginar tantas medalhas como as que lhe são prometidas antes dos Jogos porque sabe perfeitamente que tem um país mais pequeno do que por vezes o levam a pensar, que os recursos são escassos e o investimento exíguo, que o desporto escolar é uma inexistência e um Carlos Lopes ou uma Rosa Mota não se fabricam de encomenda. Países como a China, ou como os EUA, ou como a Rússia e todos os seus antigos satélites da “cortina de ferro”, há décadas que tratam o desporto como um pilar essencial do sistema de ensino, para não dizer da sociedade, integrando-o e valorizando-o devidamente. Não é essa a tradição nem a cultura portuguesa, pelo que não se pode exigir contrapartida de um investimento que não se faz, ou que, em geral, se faz pelos mínimos.

A demografia decide o resto. Por simples cálculo de probabilidades, não admira que um desses atletas excepcionais que mal precisam de apoio para se afirmarem por si sós apareça mais depressa no município de Chongqing, que tem 31 milhões de habitantes, do que num país com apenas dez milhões, onde os velhos são cada vez mais e as crianças cada vez menos.

As decepções que chegam com os Jogos tornam-se especialmente dolorosas porque os tais oráculos – jornalistas, comentadores, especialistas e toda a máquina que vive da ‘chama’ olímpica desde que ela se acende até que se extingue – alimentaram indevidamente as mais altas expectativas. Antes da partida já todos os atletas foram mais ou menos obrigados a dizer na televisão que, sim, sonham com as medalhas. Como se lhes fosse possível não sonhar. Só que a confissão desse sonho rapidamente passa a ser lida como um compromisso num país frustrado e carente. E os atletas tornam-se vítimas, ora da sua própria e legítima ambição, que os levou a sonhar alto de mais, ora dessa lógica perversa com que são geridas as expectativas sobre o seu desempenho. Depois, perante a derrota, há quem comece a justificar-se com o que não deve, seja o tempo seja o árbitro. Poupem-nos! Nos Jogos como na vida, é preciso enfrentar a derrota com o mesmo brio e dignidade com que se deve celebrar a vitória.

Se ainda houvesse dúvidas sobre quem manda no Kremlin, estariam dissipadas: é Vladimir Putin, o primeiro-ministro, e não Medvedev, o Presidente que ele inventou para lhe guardar por quatro anos o seu anterior gabinete. A prova está no facto de Medvedev anunciar a cessação das operações militares na Geórgia e, no dia seguinte, os tanques avançarem Geórgia adentro. Quanto ao resto, nada de novo. A Rússia faz o que está na sua natureza: controlar o império, à lei da bala se necessário. A UE e os EUA estrebucham, mas pouco. É natural. Depois da invasão ilegal do Iraque e da independência artificial do Kosovo, que autoridade lhes resta para defender a pretensão da Geórgia e travar o czar vermelho?

Por: Fernando Madrinha

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