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Novos bonecos no “contra-informação”?

São tempos curiosos os últimos. Um acontecimento desportivo que deixou Portugal em êxtase, um salto inesperado do 1.º ministro para a Europa que acabava de conhecer Portugal “no seu melhor”. Um país de alma motivada que, num certo dia, acordou desgovernado. Uma espera, em tempo de ressaca de festa, que culminou numa decisão legítima, democraticamente correcta e, sobretudo, exercida com a independência que se espera de um verdadeiro presidente da república.

E na proporção do salto de Barroso para a presidência da Comissão Europeia, salta Santana da Câmara de Lisboa para o lugar que há muito acreditava merecer.

Do outro lado, a derrota pessoal de Ferro Rodrigues, já há muito vislumbrada, aparece da pior forma, ainda que, para o PS, na melhor altura. Assumir-se o que quer que seja de pessoal sobre uma decisão, que só poderia ser tomada a pensar nos dez milhões de portugueses, é arrogante e desconsidera o Presidente da República. Ou pensaria Ferro que a estima “pessoal” que lhe merecia, justificava a decisão contrária? Enfim… pior só os comentários de Ana Gomes. Mas estes saltos, quedas e imperdoáveis histerismos, configuram-se numa nova banda desenhada, interessante e imprevisível.

A decisão do PR foi, também, justificada pela necessidade de dar continuidade às políticas iniciadas. Mas Santana, que não vive sem agitação, partiu logo para uma substituição maioritária dos ministros, mesmo dos que, por terem substituído outros, não tiveram tempo para mostrar como punham em prática essas políticas. Não resistiu a pôr em causa a orgânica do governo e partiu pastas, fez novas associações temáticas, que obrigam a alterar a lei orgânica dos ministérios. Falou da possibilidade de descentralizar o governo, em direcção a Norte e a Sul, deixando em pulgas os políticos locais que lideram as novas áreas metropolitanas. Ainda que não sejam alterações à política do governo são, com certeza, alterações à forma de as exercer. E para Santana a forma é importante. Mas outra coisa não seria de esperar, de um Santana fragilizado por uma chegada a primeiro-ministro feita por uma porta que não a grande. Agora no palco, não deixará de aparecer em todas as cenas a que tem direito. É o seu governo, são os seus ministérios. É a sua forma.

Eu, pessoalmente, acho que Santana Lopes está delirante. Quando se chega a primeiro-ministro por vitória eleitoral, existiu previamente um exercício de imaginação de poder. Para Santana não houve período de adaptação e por isso não resistiu a uma entrevista em local privilegiado ou a tornar pública a aceitação dos ministros convidados, à medida que os mesmos se foram manifestando. Logo que pode, mostrou-se ao país como pleno decisor e, sobretudo, como merecedor da confiança imediata dos seus futuros colaboradores. Por outro lado, sabe que a sua presença é forte, que é capaz de convencer pelos media, e por isso não se escusa de mostrar a sua elegância, a emoção com que reveste os seus discursos.

Mas, neste conturbado momento político, não é menos importante a agitação interna em que vive o partido socialista. O futuro secretário-geral, obviamente José Sócrates, soube chegar ao lugar de uma forma racional e cautelosa, atributos ultimamente alheios a muitos dos seus colegas militantes. Tal como Santana, soube aproveitar os benefícios da grande entrevista, mas de uma forma menos emocional e, sobretudo, mais ponderada. Soube criticar o criticável, dentro do próprio partido e assumir uma posição sensata relativamente à decisão de Jorge Sampaio. Pode não ter a força de Vitorino, mas traz um novo alento a um PS desgastado, e poderá consolidar a oposição, e sobretudo a candidatura às próximas legislativas com riscos bastante menores que os que corre Santana Lopes. Se calhar Sampaio não se alheou assim tanto dos interesses do PS.

Acho que estamos preocupados, mas também curiosos, e isso é bom. Outra dúvida é saber de que forma é que estes novos, e futuros, posicionamentos se vão reflectir nas candidaturas à Câmara da Guarda. Haverá notícias brevemente?

Por: Cláudia Quelhas

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