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Nova viagem à roda da parvónia

Crónica Política

«Que à nossa face envelhecida e dolorosa a reflicta o espelho com que a vemos; mas que nos seus traços de fadiga ou de aflição a reconheçamos como nossa. Só na loucura se perde a identidade de quem somos.» – Vergílio Ferreira

Tudo se passa como se o problema fosse legitimado por uns iluminados que se arvoram em paladinos da defesa da cultura da «prenda», do «arranjinho», da cortesia e tudo o mais que, em verdadeiro rigor, é apenas a ponta da forquilha, factor C – a cunha nacional.

Instituição nacional, que vai tendo, cada vez mais, os seus putativos servidores, funcionários zelosos que ao primeiro sinal de conveniência se apressam a servir o chefe.

Belos préstimos e salamaleques recebe-se a dita «prendinha»!

Ficou-se, inclusivamente, a saber que até um ex-presidente da República Portuguesa recebeu as «chamadas prendinhas»!

Desde uma galinha, até relógios, canetas e outras prendas que nem foram mencionadas.

Isto revela ao que o País chegou: um bando de corruptores, corruptos, vendilhões, compradores e traficantes que se governam desgovernando.

Sempre foi assim, desde a nossa fundação até hoje.

Grave, muito grave é nada acontecer a quem recebe ou dá.

Ninguém é ingénuo, não há almoços grátis.

Ou será que os há? Os ingénuos, claro!

Os poderes são feudais.

Os feudos ainda são rurais, no tempo e no modo.

Interligam-se, sub-repticiamente, nos meandros das convivências e conivências.

As cortesias do costume….

Influencia-se para não se ser apanhado…

Mas, não se julgue que «as prendinhas» são só ao nível superior….

Nada disso…..

Cá por baixo, nos serviços, nos institutos, nas mercearias, tascas e outras regedorias, o mesmo…..

Quem investiga? Ninguém, pela simples razão que os que investigam também não têm as mãos livres…..

Denunciar? Para quê?

Corrupção total!

Que educação é esta?

Bem sei, que não se aprende nos bancos da escola mas, será difícil acabar com tudo isto?

Difícil, pois é …

Temos, então, que um antigo Presidente da República, que ocupou o cargo simbolicamente mais importante do Estado, se gaba de durante o seu mandato ter recebido “prendas de Natal” que “não cabiam em três salas”. E acrescenta que “nunca comprei uma caneta ou um relógio mas nunca me senti minorado na minha honestidade por causa disso”. E exemplifica dizendo: “Esta caneta que uso foi-me oferecida. Mas não sei dizer quem ma deu”.

Terá, Jorge Sampaio, consciência do efeito público que estas suas declarações provocam?

Mas, será que um Sampaio percebe, ou não quer perceber, que o recebimento de prendas é algo que nunca, em causa nenhuma, se deveria verificar.

Nem receber, nem tentar aliciar para dar, ou sequer oferecer!

O que eu gostaria de ter ouvido um antigo Presidente da República dizer era: “Posso ter ofendido imensa gente durante o meu mandato, mas garanto que todas as prendas que me enviaram foram devolvidas pelos serviços da Presidência. E só uso canetas compradas por mim ou oferecidas pelos meus familiares e amigos”. E acho que é isto que os cidadãos têm o direito de esperar do mais alto magistrado da Nação. Do mais alto e de todos os que exercem funções públicas.

Isso sim, seria um bom começo para que muita coisa mudasse neste país.

Isto sim, seria a forma como um qualquer cidadão, desde o mais «magno» até ao mais ordinário, se deveria comportar.

Aceitar canetas, relógios, viagens, bilhetes para jogos de futebol é o mesmo que aceitar a «ridicularia» de uma galinha.

Exactamente o mesmo!

Mas também um Ângelo Correia acabou por se baralhar e contradizer-se.

Primeiro, afirmou que era normal fazer ofertas, depois que só se dava prendas a amigos e, por fim, que davam também a administradores de empresas com quem mantinha relações comerciais.

Esclarecedor…

E que dizer de um Catroga, Eduardo ex-ministro da Economia de um Cavaco, o tal dos 9.000 euros de reforma, que veio dizer que admitiu ser normal receber ofertas e até “brincou” ao dizer que, quando saiu do Governo, o seu Natal passou a ser mais “reduzido”.

Não há paciência!

Pois é… Depois há uns lixos tóxicos que nos asfixiam e matam!

Para uns fartura, para outros factura!

Agora, outro «caso» vai a julgamento…..

Ao fim de cinco anos, vai começar o “Caso Portucale”.

É conhecido como o caso de um ilustre e célebre cidadão (?) designado de Leite Capelo Rego.

Mais um «caso» que vai começar… Para encher jornais, televisões, rádios, revistas e… talvez até, quem sabe, a Maria ou a Caras!

Tudo para nada!

Virão os habituais «defensores» jurar pela «honra» da tia de Cascais, que já morreu no tempo da D. Maria, sem Capelo e, muito menos Leite e Rego, que não e não que os senhores são «digníssimos» chefes de fila, que até costumam dar uma esmolinha ao cego da igreja da Senhora do Coito; todos os domingos vão à missa, comem hóstias e deliciam-se com o terço da irmã Boavida; e, repetirão até à exaustão que os «senhores» tratam bem os cães, gatos, pássaros e passarinhas da família; que não e não, que os «doutos» são figuras da mais fina «estirpe» que alguma vez uma rameira pariu na maternidade da senhora dos aflitos.

Só cortesias, abonos e mais abonos… de uma justiça cuja virgindade foi perdida nos tempos da padeira, quando o forno cozia o pão misericordioso e redentor.

Depois virá o Face que já é Oculta. Nada se dirá….

Assim como já foi noutros e tantos casos, Macau, Melancias, Emaudio, Moderna, Independente… a perder de vista.

Mas, por cá, na volta da parvónia paroquial, ficou-se a saber que a cultura… só mesmo a do milho.

Pois a verdadeira, a que forma, educa e, como diz Ortega y Gasset, in “O Livro das Missões”, «A cultura é uma necessidade imprescindível de toda uma vida, é uma dimensão constitutiva da existência humana, como as mãos são um atributo do homem», reduzida aos mínimos ou extinta.

Fecha-se uma Casa de Cultura, em Famalicão, por razões financeiras, dizem.

Desligam a iluminação pública, por razões…..financeiras!

Afinal, para quem só sabe viver e gerir com impostos e empréstimos, um dia a casa tinha de vir abaixo.

Nem com as prendinhas e cortesias se lá vai…

Tudo a ver com prendas e cortesias, por estranho que possa parecer!

Depois admiram-se que os portugueses se estejam nas tintas para a cidadania e para a participação em actos eleitorais.

Sejam sinceros e honestos, pedir muito?

Tudo isto é uma triste comédia.

Que saiam de cena os péssimos actores e apaguem as luzes… para poupar!

Por: Jorge Noutel *

* deputado do Bloco de Esquerda na Assembleia Municipal da Guarda

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