O ano chega ao fim, mas demasiado imprevisível para que se possa dizer que é chegado a bom porto. A eleição de Trump prenuncia tempos difíceis. A obsessão pelo politicamente incorreto, muito mais do que servir o propósito de conter os excessos policiadores, às vezes até ridículos, do politicamente correto, pelo contrário serve o propósito de libertar a violência da exclusão. E nisto Trump não está só. Como ele que se dispõe a excluir os mexicanos, também Nigel Farage se dispõe a excluir os imigrantes no Reino Unido, Viktor Órban se dispõe a excluir os refugiados sírios do seu país. Em comum, todos estes e muitos outros mostram a mesma vontade de fazer da exclusão o principal motor da política. Seria terrível que a tomada de posse de 2017 – Trump finalmente Presidente da maior potência do mundo – significasse a capitulação das políticas de inclusão.
Mas Trump, agora acompanhado por Putin, promete um novo ano que mais parece um regresso aos anos da ameaça nuclear. À frente dos dois maiores arsenais nucleares do mundo, e depois de uma década convencida da bondade da não proliferação de armamento desta índole, eis que a mensagem de Natal de ambos foi que os seus respetivos arsenais deveriam expandir-se. São loucos, pelo menos no sentido gaulês “ils sont fous” com que Asterix e Obelix se reportavam aos romanos.
Por cá, o primeiro-ministro António Costa, no seu discurso natalício, disse uma frase cheia de valor – «A pobreza e a precariedade laboral são as maiores inimigas de uma melhor economia». Essa é precisamente a viragem que importava fazer. O desenvolvimento social é tanto ou mais determinante do desenvolvimento económico do que o inverso. Oxalá, este 2016 que nos correu razoavelmente bem, apesar de todos os riscos, possa, com passo mais firme, devolver prosperidade aos portugueses em 2017. E aos portugueses que habitam este interior. Mas, há tanta Europa desunida e mundo belicoso que está para lá das nossas mãos.
Estamos na quadra natalícia. Como as palavras, também o significado das festas é o que dele fizermos. Acima de tudo, o natal é uma festa que celebra o nascer, não como facto biológico, mas capacidade humana. Por isso, faz sentido que nela importem muito as crianças e as esperanças de que elas são os nossos melhores símbolos. É também uma festa que celebra e recorda a capacidade de romper com a necessidade e de trazer um novo começo. Erramos demasiado para que pudéssemos sobreviver sem essa capacidade, que é, no fundo, uma outra maneira de falar de liberdade. Parte importante do pensamento da filósofa judia Hannah Arendt passou por esta ênfase no nascer. E nada disto é religioso. O que não significa que nada disto seja indiferente a uma ou muitas festas religiosas. Pelo contrário. O que deve incomodar é outra coisa: que o natal, este que se tornou universal, possa ser sobretudo uma má-consciência que se alivia com um ritual. O Natal não é apenas uma festa privada, de famílias viradas para os seus. Há um mundo lá fora que não pode perder a capacidade de renascer. Estes são os meus votos para 2017.
Por: André Barata