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«Na Guarda há um divórcio entre o público e o cinema»

Cara a Cara – Entrevista: António Godinho

>P – O Cineclube da Guarda comemorou no fim-de-semana cinco anos de existência. Que balanço faz do percurso da associação?

R – Embora não conheça a realidade do Cineclube ao longo do tempo, visto que o meu conhecimento é limitado à minha escassa participação até Março deste ano, data em que tomei posse, diria que foi uma aposta que vingou. Embora já tivesse havido experiências cineclubístisticas na Guarda, foram sempre sem uma expressão institucional, de grupos que se criaram e se congregaram em torno de interesses de cineclubes comuns. Como instituição, o Cineclube da Guarda é a associação cinéfila com maior longevidade na Guarda. Pelas actividades, pelo número de sócios e pelo envolvimento e imagem, creio que o balanço é positivo.

P – O Cineclube dizia, aquando do seu surgimento, não haver diversidade cinematográfica na cidade, que não se abordava a História do Cinema, e que queria preencher esta lacuna. Tem cumprido os objectivos?

R – Não totalmente porque há um problema hoje, como se sabe, que é existirem formas de consumo de cinema cada vez mais construídas pelas próprias pessoas. As pessoas compõem o seu gosto pelo cinema e têm cada vez mais formas diferenciadas de o consumir, designadamente a nível doméstico. A forma clássica de se sair de casa para ir ver cinema está hoje em crise. Tem a ver com as novas tecnologias. Procuramos lutar contra isso e não impor um gosto cinéfilo, mas dar-lhes a possibilidade de ter contacto com alguns cânones do cinema.

P – Está a ser complicado combater essa tendência?

R – É muito complicado, em termos globais, e na Guarda mais ainda. Aqui na Guarda há um divórcio entre o público e o cinema, tirando alguns casos excepcionais. Mesmo ao nível da exibição comercial, as taxas de ocupação, quanto é dado a saber, são muito fracas. A nossa estratégia é, para já, criar condições para que as pessoas vençam as resistências que sentem em sair de casa para irem ver um filme. Há que lhes lembrar que o confronto que têm com uma obra cinematográfica numa sala é totalmente diferente do tipo de relação que têm a ver cinema em casa, independentemente do equipamento que possuam ou da sua dimensão. O significado de cinema num espaço público é distinto. Se as pessoas forem educadas para o que isso significa, em termos de usufruto dessa obra, já teremos o nosso trabalho cumprido.

P – Que actividades desenvolve o Cineclube?

R – A nível de exibição, temos um protocolo com o TMG e indicamos mensalmente um filme, que é projectado no pequeno auditório. Para já, posso adiantar que vamos criar um serviço de empréstimo de filmes, mas só para os associados. Por outro lado, estamos em negociações com outras instituições no sentido do Cineclube programar cinema nessas instituições.

P – O que se pode esperar desta direcção, a que preside desde Março?

R – Devo dizer, antes de mais, que nunca tive o anseio de ocupar o cargo. Entraram mais duas pessoas além de mim. Estas mudanças ocorreram porque houve uma substituição a meio do actual mandato, tal como está previsto nos estatutos, que não obrigam a novas eleições. Para já vamos cumprir este mandato, que tem mais um ano. A nossa maior preocupação, neste momento, é arrumar a casa. Estabelecemos prioridades e a principal é, digamos, recarregar baterias. Noutra fase avançaremos para outro tipo de actividades, o que deverá acontecer, ao que tudo indica, no próximo mandato.

P – Que projectos são esses?

R – Queremos diversificar as actividades. Há a ideia de fazer do Cineclube também um arquivo cinematográfico, acessível a escolas e outras instituições, que o queiram usar. Por outro lado, queremos apostar também na realização de actividades de formação na área do cinema e ainda na diversificação da programação.

P – E em relação às apostas cinematográficas?

R – Vamos continuar a apostar na cinematografia nacional e, nomeadamente, nos novos autores, contemporâneos ou revelados há pouco tempo. E também no documentário. Depois no cinema independente, que também temos abordado, europeu e norte-americano. Noutra fase, a ideia é retomar a divulgação – do que considero serviço público –, que é o mesmo que fará uma Cinemateca, organizando ciclos de cinema de autor, ligado a um tema ou género específico. A vertente experimental é posta de parte.

P – Quantos associados tem o Cineclube da Guarda?

R – Tem cerca de 130 associados.

António Godinho

«Na Guarda há um divórcio entre o público e
        o cinema»

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