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Municípios ponderam denunciar contrato com Águas do Zêzere e Côa

No centro da discórdia estão os aumentos de 10 por cento nas faturas da água e 15 nas do saneamento

A “guerra” entre municípios e Águas do Zêzere e Coa (AdZC) continua sem fim à vista. Reunidas na semana passada em Manteigas, as autarquias acionistas da empresa multimunicipal de abastecimento de água e saneamento decidiram mesmo avançar com uma ação em tribunal. O objetivo é rescindir o contrato da concessão e sair do sistema caso não se chegue a um entendimento. Em causa estão os aumentos nas faturas da água e saneamento, anunciados no ano passado.

Foi um ultimato claro aquele que os autarcas deixaram no final da reunião: «Damos um prazo de 90 dias para que o contrato seja revisto, se isso não acontecer, teremos de recorrer ao tribunal», garantiu o presidente da Câmara de Pinhel, António Ruas. Em Manteigas, a maioria dos municípios votou a favor do documento onde se prevê a denúncia do contrato por «terem sido alterados pressupostos ao longo do tempo sem que os acionistas soubessem». A saída da Câmara da Covilhã do sistema e a alteração de outros aspetos iniciais do contrato são apenas algumas das queixas dos municípios. Antes de decisões drásticas, os autarcas optaram por solicitar uma reunião com a ministra do Ambiente, Dulce Pássaro, que na altura deu “luz verde” aos aumentos de 10 por cento na água e 15 no saneamento. Na tentativa de chegarem a um entendimento, os acionistas quiseram expor as suas preocupações à tutela na terça-feira, fazendo ver que «o contrato com os valores atuais é completamente insuportável para os cofres das autarquias», referiu.

Perante um cenário de crise e com orçamentos camarários mais apertados, António Ruas já tinha deixado, na semana passada, um aviso: «Estas novas tarifas arruínam os cofres de qualquer Câmara». Nesse sentido, se depois dos 90 dias todas as negociações falharem, o autarca admitiu que o próximo passo pode passar pela rescisão do contrato, o que implica que estes municípios encontrem uma alternativa de abastecimento de água e saneamento. O também presidente da Associação de Municípios da Cova da Beira está consciente de que, sem rios ou barragens, nem todas as autarquias têm forma de gerir os próprios sistemas, mas garante que «aqueles que têm albufeiras e outras maneiras de abastecer já se mostraram solidários com os municípios que não dispõem desses recursos».

«Munícipes não podem pagar valores tão altos»

Outra das preocupações das autarquias diz respeito aos munícipes. Se as previsões dos autarcas se confirmarem e as finanças camarárias não forem suficientes para pagar as novas tarifas, a fatura poderá sair mais cara ao munícipe? António Ruas garante que essa não é uma opção viável: «Podíamos pôr os munícipes a pagar 10 euros em vez de um, mas a maioria são pessoas reformadas com poucos recursos e não podem pagar valores tão altos», declarou. Na semana passada, o presidente da Câmara de Belmonte também tinha sublinhado esta questão, pedindo uma «medida de justiça» para a região. «A população tem um poder de compra baixo e não consegue pagar faturas com valores tão elevados, além de que também houve financiamento reduzido para as câmaras, que ficam com dificuldades em auxiliar as pessoas com problemas financeiros», lamentava Amândio Melo, que contestou desde início a subida dos preços, apesar de fazer parte do Conselho de Administração da AdZC, em funções não executivas.

Também o presidente da Câmara de Figueira de Castelo Rodrigo, António Edmundo, admitiu que «a disparidade dos preços é muito grande» e recomendou a existência de «um equilíbrio», tal como acontece com a fatura da eletricidade. Por sua vez, Joaquim Valente acrescentou que o contrato de concessão «deve ser revisto, porque os pressupostos iniciais já não são os mesmos». O edil da Guarda considerou ainda que devem ser tidos em conta «os direitos perequativos, no sentido de se encontrar uma tarifa única para todo o território». Contactado por O INTERIOR, o Conselho de Administração da AdZC fez saber que só iria prestar declarações após a reunião das autarquias com a ministra do Ambiente, na terça-feira. Contudo, até ao fecho desta edição, não foi possível obter qualquer comentário da empresa. A AdZC serve, desde 2000, os municípios de Almeida, Aguiar da Beira, Belmonte, Celorico da Beira, Figueira de Castelo Rodrigo, Fundão, Guarda, Manteigas, Mêda, Penamacor, Pinhel, Sabugal, Fornos de Algodres, Gouveia, Oliveira do Hospital e Seia.

Seia e Oliveira do Hospital «não assinaram acordo»

Só dois municípios não assinaram o documento com a decisão tomada na reunião da última quinta-feira, em Manteigas. Seia´, cujo município não participou nem se fez representar, e Oliveira do Hospital não votaram a favor da denuncia do contrato se a AdZC não se mostrar disponível para o rever.

O presidente da autarquia de Seia explicou a O INTERIOR que «o município está solidário» com os restantes acionistas, mas defende apenas que o contrato seja revisto e não a saída do sistema. «O que está em causa é que o contrato foi celebrado há muitos anos e necessita de ser renegociado», esclareceu. Segundo Carlos Filipe Camelo, «a solução não deverá passar por uma saída do sistema», até porque «nem todas as autarquias estão na mesma posição». Nesse sentido, recorda que está a decorrer uma fase de construção de várias Estações de Tratamento de Águas Residuais (ETAR) e que uma rescisão de contrato com a Águas do Zêzere e Coa iria «inviabilizar e colocar em causa projetos importantes da região». «Nem sequer é possível sair do sistema de forma unilateral», acrescenta ainda, especificando: «O contrato não permite isso». Embora admita que o aumento das tarifas não é a melhor opção, o edil senense alerta que tem de haver «uma solução integrada, porque, caso contrário, não há futuro para nenhuma das partes». É que os 16 municípios são os principais clientes desta empresa de abastecimento de água e saneamento.

Reunião em Lisboa para «sensibilizar ministra do Ambiente»

Alguns dos municípios acionistas da Águas do Zêzere e Coa reuniram na última terça-feira com a ministra do Ambiente, Dulce Pássaro.

Segundo o presidente da Câmara de Belmonte, as autarquias pretendiam «sensibilizar a ministra para a assimetria que se verifica nas tarifas» da água e saneamento. «Tendo em conta que a empresa está com dificuldades financeiras e os municípios também não conseguem suportar valores tão elevados nas faturas, pedimos que fosse dada ajuda financeira à AdZC», explicou Amândio Melo. As autarquias acionistas têm assim esperança que Dulce Pássaro possa analisar estes problemas e atender às especificidades do interior do país. «Queremos que a senhora ministra consiga analisar a situação e arranjar uma solução junto da administração central», adiantou ainda o edil belmontense. Amândio Melo esclareceu que os municípios pretendem uma resolução que seja favorável a ambas as partes, mas reconheceu que mantêm o “ultimato” feito na semana passada e dão 90 dias para que haja um entendimento. «Se até lá não houver resposta, não temos alternativa se não recorrer ao tribunal», acrescentou.

Catarina Pinto Autarca de Pinhel diz que contrato com a AdZC é «insuportável para os cofres das autarquias»

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        Águas do Zêzere e Côa

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