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Menos que Zero

A vitória de Cavaco Silva encerrou mais um capítulo na História de Portugal. A partir do próximo dia 9 de Março, os Portugueses vão ter o primeiro Presidente da República de centro-direita e, como se verá, a sua actuação pautar-se-á pelos mesmos princípios gerais que nortearam as anteriores presidências.

Fecha-se assim o capítulo do pós-25 de Abril, um período durante o qual o preconceito contra a direita foi alimentado por aqueles que teimam em ir ao baú da história recuperar episódios escabrosos que lhes permitam tirar dividendos eleitorais. Com esta votação, os portugueses demonstraram que numa verdadeira democracia não há nada a temer.

1. Resultados

Aconteceu o previsto: Cavaco Silva ganhou na primeira volta, Manuel Alegre ultrapassou largamente Mário Soares, Jerónimo Sousa segurou o eleitorado comunista e ainda conseguiu mais votos do que Francisco Louçã. Com mais ou menos rigor, a urnas confirmaram as sondagens.

2. Reacções

A esquerda reagiu mal aos resultados. Logo na noite eleitoral, alguns candidatos desta área política acusaram o PS de nada ter feito para conseguir uma candidatura única, facilitando assim a vitória de Cavaco Silva. Foi o início de fogo cruzado que vai durar semanas.

Mas as piores reacções chegaram da esquerda não partidária. O argumento mais ouvido foi o da “vitória tangencial”, algo muito discutível quando o segundo colocado, Manuel Alegre, ficou 30 pontos atrás de Cavaco Silva. Aliás, a votação em Cavaco Silva foi superior às de Sampaio, em 2001, e Sócrates, em 2005, por exemplo.

Houve ainda quem tentasse apequenar a “cultura tecnicista e tecnocrática” de Cavaco Silva face à “aristocracia e cultura” dos anteriores presidentes, um argumento que é tão ridículo quanto deprimente.

3. Pergunta da noite

O que vai fazer Manuel Alegre com mais de um milhão de votos?

Nada, suponho eu. Os votos de Alegre são, em grande medida, um voto de protesto contra as políticas governamentais ou contra o candidato Soares.

Há quem anseie por um ataque do PS a Manuel Alegre na esperança de que ele avance para a formação de um novo partido político. Não me parece uma opção com grande futuro. Basta recordar a vida efémera do PRD, também ele nascido à sombra de uma figura presidencial.

4. Futuro

Mantenho o que escrevi na semana passada: a vitória de Cavaco Silva foi o melhor resultado para o Governo socialista. Alegre e Soares não dariam um minuto de descanso a Sócrates, o primeiro por despeito, o segundo por se considerar o pai do socialismo e da democracia em Portugal.

Para além disso, o pragmatismo da actual governação socialista assemelha-se bastante ao que os sociais-democratas defendem, pelo que só uma deriva populista de uma das partes poderia justificar um cenário de conflito. Sem eleições no horizonte é pouco provável que isso aconteça.

A palavra estabilidade é muito cara a Cavaco Silva. Ele sabe melhor que ninguém o que é governar com a oposição do Presidente da República e, talvez por isso, não se cansou de repetir que a estabilidade é essencial para Portugal sair da crise. Resta-nos esperar que a tão apregoada “cooperação estratégica” dê frutos.

Por: João Canavilhas

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