Ser maricas é, antes de tudo, um estado de alma. Talvez por isso existam maricas em toda a parte: na rádio, na política, nas empresas – grandes e pequenas. Até na poesia há maricas.
A existência mais profunda do maricas assenta no medo. E, à medida que os anos passam, a mariquice ganha raízes maiores. Ou porque os sonhos ficaram para trás ou porque, simplesmente, o armário do maricas cresceu. Com o tempo, o maricas vê-se a ficar para trás, a destilar ódios de estimação e a arquitetar planos de morte contra os não-maricas. Felizmente, e por cobardia, nunca os chega a concretizar.
Genericamente, há dois tipos de maricas. Os maricas chicos-espertos são graduados na arte da boa escalada social. Conseguem ser eleitos para lugares de referência e, uma vez aí chegados, fazem-se rodear por outros maricas. Estes maricas vivem em bandos – especializados na arte de combater a competência. Porque maricas que é maricas tem medo de perder o lugar.
Depois há os maricas-desgraçados, que nunca passam da cepa torta. Quando observados no seu habitat natural, rapidamente se constata serem a espécie mais perigosa: sabem de cor as artes da subtileza. E não é difícil distingui-los.
1. O maricas não sabe conviver com o sucesso alheio. Regra geral, atribui o seu insucesso aos outros: a culpa é da sociedade, que não se compadeceu dele. Esta falta de tolerância para com a sua mariquice deu-lhe cabo dos nervos – se assim não fosse, também teria tido sucesso. E é assim que o maricas se vai convencendo de que tem talento. Faltou-lhe foi a sorte.
2. O maricas é mestre na arte da vassalagem. A bagagem que tem escondida no armário torna-o inseguro e cheio de tiques nervosos. O maricas tem medo que um dia alguém desconfie que é maricas. E é por isso que faz de tudo para agradar aos que estão sentados no trono. Bajula e ensaia ao espelho a melhor maneira de dizer “senhor doutor”, na esperança de ser aceite e reconhecido. É para isto que vivem os maricas.
3. O maricas espezinha os mais fracos sempre que pode. É para compensar as horas perdidas em esquemas de vassalagem.
4. O maricas é hábil na arte do maldizer. Muitos maricas fazem doutoramentos e investem em outros graus académicos para aprender a dizer mal de alguém sem que o seu interlocutor se aperceba de quão mal-intencionada é a conversa.
5. O maricas nunca se desvia dos padrões socialmente estabelecidos. É uma forma de ninguém desconfiar da sua mariquice crónica e, em simultâneo, uma maneira de poder mais facilmente apontar o dedo aos outros. Se fosse pelos maricas nunca haveria revoluções.
6. Para o maricas não importa de quem se fale mal, desde que se fale mal de alguém: enquanto a comunidade estiver focada noutro alvo, mais dificilmente a sua mariquice será detetada.
7. O maricas não sabe perdoar ou deitar para trás das costas – apesar de até visitar religiosamente a igreja do bairro. Muitos maricas até cantam no coro, para dar provas da sua santidade. O maricas sabe que se não perdoar a um amigo poderá dormir mais tranquilo: terá sempre uma arma para proteger o seu armário.
8. O maricas nunca faz um elogio pela frente (exceto nas situações previstas no ponto 2) e aproveita toda e qualquer oportunidade para realçar o pior que existe nos seus pares.
9. O maricas nunca perde uma cusquice: quanto mais informação tiver em sua posse, mais protegido estará.
10. Se a coisa der para o torto, o maricas é sempre a vítima. Ou do destino. Ou da sociedade. Ou do governo. Ou do vizinho.
11. Maricas que é maricas é invejoso. Inveja os que não precisam de esconder a mariquice.
12. O maricas anda sempre cansado. Afinal de contas, ser maricas dá trabalho.
Mais dia, menos dia, o maricas acha-se em maus lençóis. O armário explode e o maricas fica em fanicos – um horror! –, soterrado debaixo de tábuas de madeira, centenas de esqueletos e outros tantos fantasmas. E enquanto os não-maricas se passeiam aos domingos com a família e os cães e os gatos, o maricas tomba inconsciente na banheira da casa-de-banho, semi-afogado em mentiras, falsificações, tramóias e maledicências.
Só quando agoniza é que o maricas compreende que o melhor que poderia ter feito teria sido sair do armário. O quanto antes.
Por: Rosa Ramos