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Mais Almaraz? Não

Espanha dispõe de uma mão cheia de centrais nucleares, mas apenas uma delas, Almaraz, está a cerca de 100 km de Portugal. A operar há mais de três décadas, logo essa é a mais velha a funcionar em Espanha. E há muito que não devia estar a funcionar. Já em 2011, depois do acidente nuclear de Fukushima, resultado de um Tsunami, alertava-se para o facto de o sistema de refrigeração de Almaraz depender de uma barragem cuja construção não é anti sísmica, o que logo expõe a central nuclear aqui mesmo ao lado a riscos semelhantes aos que conduziram ao acidente de Fukushima. Mas a realidade consegue ser pior, como tem alertado a associação ambiental Greenpeace. Almaraz nem sequer dispõe do sistema de válvulas que preveniram uma explosão de hidrogénio em Fukushima. Também não dispõe de um plano para uma gestão eficaz de acidentes graves, desde logo no que respeita à não disseminação de radioatividade. Se Fukushima correu mal, um terramoto da mesma intensidade em Almaraz teria, muito provavelmente, corrido pior. Em suma, confiar na segurança de Almaraz é mais ou menos o mesmo que deixar tudo nas mãos de Deus ou da boa sorte. Com toda a razoabilidade, a Greenpeace prefere recomendar, e bem, a desativação ordenada de uma instalação nuclear que quanto mais obsoleta mais perigosa se torna.

O eurodeputado Carlos Zorrinho, em meados do mês passado, e com base na inexistência de suficientes garantias de segurança da Central, defendeu o óbvio: o seu encerramento. O partido PAN outra coisa não tem pedido. Vários outros partidos têm acumulado sinais de preocupação. O Conselho de Segurança Nuclear espanhol acha que nada vai mal. Contudo, vão sucedendo a cada vez maior ritmo falhas em sistemas de arrefecimento, o que suscitou dúvidas sobre a segurança de Almaraz entre um conjunto de técnicos desse mesmo organismo de segurança nuclear espanhol.

O governo português pediu, com urgência, uma reunião com a ministra do Ambiente de Espanha para discutir o assunto. Lamentavelmente, o governo congénere, antes de qualquer reunião, que deveria ter lugar no próximo dia 12, decide licenciar a construção de um aterro para resíduos radioativos em Almaraz. Surpreendido, o ministro português do Ambiente, João Matos Fernandes, informa que não reunirá com a sua homóloga espanhola se não houver um recuo. E fez muito bem. Além do incumprimento de uma diretiva comunitária, que impõe um protocolo de contactos e acordos em zonas transfronteiriças, está em causa uma tentativa de política do facto consumado que condiciona interesses vitais para o nosso país. Almaraz, além de estar a 100 kms de Portugal, refrigera-se com as águas do nosso, sim também nosso, rio Tejo. Não é difícil conceber o alcance da destruição que um desastre em Almaraz traria a Portugal, muito mais do que a Espanha, única e exclusiva beneficiária da sua produção energética.

O mais incrível é que, do ponto de vista dos riscos, Portugal não difere verdadeiramente de nenhuma potência nuclear, mas com a diferença de nada decidir sobre a sua própria segurança. Se já era difícil aceitar termos de suportar os maiores riscos sem nenhum benefício como contrapartida, esta condição de não termos a nossa própria segurança nuclear nas nossas próprias mãos é absolutamente inaceitável. O Governo tudo deve fazer para que Almaraz deixe de operar. Iniciativas diplomáticas bilaterais, procedimentos comunitários nas instituições europeias, mecanismos jurídicos, tudo deve ser acionado. É preciso subir de tom, em nome da nossa segurança.

Por: André Barata

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