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Mães e filhas ou o último filme de Tarantino

“A beleza deve ser procurada numa zona de oscilação entre fealdade e perfeição clássica. A beleza pode até precisar de correr o risco de ser feia.”

Allain de Botton em Ensaios Sobre o Amor

O último número de O Interior conseguiu animar-me a semana que tinha começado mal, com uma doente que me encontrou no comboio a perguntar se a colega que me acompanhava e que é, apenas, 10 anos mais nova, era minha filha!… “Não vês que a senhora é um bocadinho atrasada-mental?” tentava a minha amiga consolar-me. O que, cá para nós, agrava ainda mais as coisas, porque dos tolos e das crianças é que saem, intactas, as verdades.

À noite fomos ao cinema e, evidentemente, sendo eu a mãe, coube-me escolher: Tarantino, porque… sim. Um breve telefonema para a minha filha mais nova e mais antiga, confirmou a correcção da minha opção. Além do mais, esta, a mais velha e mais recente, não conhecia o realizador, falha imperdoável na sua formação, que urgia corrigir.

Aqui é que começa o importante papel de O Interior, com o artigo do Hugo Sousa. Depois do choque violento que representou o fim abrupto do filme logo após sabermos que a heroína, afinal, tinha uma filha, foi um alívio saber que vai haver uma 2.ª parte.

Duvido que a minha filha mais recente a vá ver, a não ser que eu consiga modificar significativamente a sua educação sentimental… talvez com o Pulp Fiction e umas coisitas do David Linch, mas eu…gostei.

É violento? É! Mas não o é mais que os desenhos animados japoneses que as nossas crianças vêem todos os dias. Não deve ser por acaso que a história da infância da chefe do clã dos “maus” é contada sob essa forma.

Tem muito sangue? Tem! Explode dos ferimentos de forma inarrável e impossível.

Então afinal onde reside o encanto?

Precisamente na inverosimilhança da história que a torna deliciosamente ridícula e ainda na cor ou na ausência dela, e finalmente na música, a fantástica música dos filmes de Tarantino.

2a boa notícia de O Interior: o meu amigo Manolo vai dar uma conferência sobre Jorge Luís Borges, logo à noite.

3ª e última, dada pelo Manuel Sabino Perestelo: afinal os primitivos também se drogavam com cannabis ou cerveja; e o autor tem a coragem de falar das duas sem dizer que uma é horrível e a outra aceitável.

Fim de semana. Pretexto para um jantar de amigos bem regado com outras duas drogas: vermuth e vinho tinto do Douro. A certa altura aparece um senhor na TV. Grande agitação na sala: “Olha o José Castelo Branco”. “Quem é esse?”, pergunto. “Então não sabes,…que foi apanhado no aeroporto com o material não declarado?” Nova imagem, mais agitação. “E este, quem é?” pergunto. “ Por amor de Deus em que mundo andas tu, não vês televisão?”

Tenho que me actualizar sobre os escândalos nacionais, para escrever crónicas sobre coisas realmente importantes.

P’ra daqui a 15 dias, prometo.

Agora deixo-vos. Tenho de acabar de estudar os 50 padrões de gradeamento de ferro forjado para varandas e os 200 padrões para balcões que se fabricavam em Nova Orleães em 1859.

Mas… também devia explicar-lhes a importante diferença que há entre uma coisa e outra.

P’ra daqui a 15 dias? Vamos a votos.

Por: Maria Massena

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