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Loja de conveniência

Observatório de Ornitorrincos

Há na televisão portuguesa uma parte da programação que recebe muito pouca atenção dos outros media. Falo, claro, da TV Shop e da injustiça de não merecer nem artigos de crítica ou louvor, nem sequer de constar nas programações distribuídas pelas televisões à imprensa escrita. Gostaria de saber a opinião do crítico de televisão do DN sobre o extraordinário relógio apresentado por Mozer ou de saber a que horas devo ligar o aparelho para ver a magnífica apresentação do Air Massager.

Não me parece ético que não haja audiências específicas para saber qual é a apresentação mais vista pelos portugueses. Serão os espantosos óculos com seis conjuntos de lentes diferentes ou o incrível refrigerador para colocar nas ventoinhas e refrescar o ambiente? O maravilhoso OrbiTrek será ainda o líder de audiências que o tornou clássico? Há respostas que os portugueses precisam de conhecer.

Depois há questões intrínsecas aos programas que devem ser analisadas. Primeiro é a carga sexual das apresentações. Há ali gente que finge estar a experimentar massajadores de pernas quando na realidade estão com cara de estar a massajar outra parte mais setentrional do corpo. Além disso, as expressões de surpresa dos que experimentam qualquer produto são parecidas à do Primeiro-Ministro quando soube o resultado das eleições europeias. Alguns dos figurantes das apresentações da TV Shop conseguem ser piores actores que os da novela Morangos com Açúcar.

Outro assunto que me intriga são as ofertas. Se comprar uns óculos, oferecem seis pares de lentes, uma caixa e um pano. Se comprar duas aplicações para a ventoinha, vem uma terceira e um refrigerador de latas (de bebida) à borla. E se alguém quiser comprar só o pano para limpar os óculos? Eu gostava. No anúncio diz-se ser “um fantástico pano”. A mim, o pano dava-me um jeitaço. Já os óculos, quer pela pirosice, quer pela minha recusa de usar dois pares encavalitados, não os quero para nada. Com o refrigerador de latas a mesma coisa. Dispenso aplicações para refrescar o ar que sai da ventoinha. Mas uma maquineta que gela uma lata de Coca-Cola num minuto seria muito bem vinda aqui em casa. Embora eu tenha já uma de maior porte e que refresca qualquer coisa em cinco ou dez minutos. É também um aparelho de invulgar qualidade – chama-se congelador e veio similarmente de borla, em cima de um prodigioso frigorífico.

Para os mais sensíveis, aconselha-se a ter algum cuidado com a apresentação das facas Shogun. Como em qualquer série de acção para televisão vinda do Oriente (o caso de todos os filmes com Shao Lin no título), o que ali se vê é pura ficção. Nem todos aqueles que têm esse conjunto de facas em casa podem cortar as batatas e os bifes da mesma maneira que o apresentador. Ele tem a ajuda dos efeitos especiais, lembrem-se. É como um filme do 007. Não é por se ser dono de Aston Martin ou de um BMW Z8 que um tipo se vai pôr a fazer perseguições loucas atrás de Ursulas Andresses ou Sophies Marceaus, embora a ideia possa parecer agradável.

Seria bom que não se desleixasse tanto uma parte tão significativa da televisão nacional e por uma vez nos preocupássemos com a qualidade daquilo a que milhares de estudantes universitários sem televisão por cabo estão a ser sujeitos nos seus períodos de repouso. Fica aqui o apelo às autoridades competentes.

EU VI UM ORNITORRINCO

Miguel Portas

Foi eleito para o Parlamento Europeu, um habitat natural de ornitorrincos. Os portugueses votaram maioritariamente no PS, mas o Portas mais velho acha que quiseram foi tirar a GNR do Iraque. Vai para Bruxelas e Estrasburgo – afirmações do próprio – para armar serrabulho contra as políticas no “neoliberalismo”. Mas se era para isso talvez fosse preferível não ter sido eleito. É que assim vai ter de assitir às sessões e ainda perde algumas manifs.

Por: Nuno Amaral Jerónimo

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