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Livros com lágrimas

LIVROS

Livros da nossa vida são também os livros que nos fazem chorar. Quando é que um livro faz chorar? Quando somos (estamos) fracos, quando o momento da leitura é de crise pessoal (e qualquer coisa nos traz as lágrimas aos olhos) ou ainda quando há semelhança clara entre os heróis lidos e os imaginados ou sonhados ou entre eles e o perfil que traçamos de nós. Finalmente quando eles nos puxam pelas recordações (amargas).

Chorar ao ler pode ser uma simples lágrima furtiva, outras vezes um jorro sem fim (temos de parar de ler), ocasionalmente algo que se repete a meio gás quando aparece certa personagem. Devo dizer que já há muito tempo que esta chuva de lágrimas não me ocorre (sinal de velhice?) mas lembro-me perfeitamente dessas ocasiões passadas.

Então que livros me fizeram chorar ao longo da vida? Aqui vão cinco ou seis portugueses que recordo, uns mais, outros menos regados. Confesso que não chorei da primeira vez que li O Amor de Perdição (de Camilo Castelo Branco) mas chorei à segunda, já na casa dos vinte e tais. São mesmo melodramáticas (mas não considero lamechas) aquelas personagens. Pela minha juventude entusiasmei-me também até às lágrimas por Um Girassol chamado Beatriz e António dos Olhos Tristes, pequenas obras de Eduardo Olímpio, olhares do 25 de Abril sobre o Alentejo, a infância e o mundo. Tudo em pequenas narrativas de encantar – de chorar. Depois, o Esteiros, do Soeiro Pereira Gomes, com meninos a sério a desafiar o mundo: as crianças são aquilo e derretem-nos de emoção. Lembro-me também de alguns anos em que me afeiçoei aos contos tristes de Maria Judite de Carvalho e li muitos livros dela: relembro aqui por exemplo Os Idólatras. Não menos forte para mim foi o Bandeira Preta de Branquinho da Fonseca, pequenas narrativas com dois rapazes da província no centro da história, um transformado no final em “peixe gordo” pescado na margem do rio.

Livros estrangeiros recordo três que me impressionaram muito quando os li: Le Grand Meaulnes (trad. O Bosque das Ilusões Perdidas) de Alain-Fournier, livro de mistério na procura pessoal de um jovem de 15 anos; Le Petit Chose (não sei se está traduzido), de Alphonse Daudet, com um enredo também ligado às desventuras de um jovem desprotegido num colégio interno, a quem todos fazem mal; e finalmente o brasileiro Meu pé de laranja lima de José Mauro de Vasconcelos, obra-prima da sensibilidade humana.

Por coincidência, estes livros com lágrimas são sobretudo ligados à infância e à juventude e às suas desventuras. Um psicanalista talvez pudesse explicar isto melhor do que eu…

Joaquim Igreja

(professor)

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