No dia 23 de Abril comemorou-se o Dia Mundial do Livro. Há dias teve início a Feira do Livro mais importante do país, a de Lisboa. Ambos eventos são propícios para reflectir sobre a excessiva edição de livros em Portugal. Afinal de contas, que mercado consegue aguentar uma avalanche diária de 40 novos livros por dia? Uma média de 13 a 15 mil títulos novos são lançados todos os anos pelas mais de 200 editoras existentes em Portugal. As livrarias já não conseguem escoar tantos livros, os críticos literários não se decidem quanto ao próximo livro a criticar, e os leitores comuns ficam desnorteados com tamanha quantidade de oferta. Estou em crer que grande quantidade de oferta não significa maior investimento na cultura ou maior acesso a ela.
Sobre este assunto, o semanário Expresso publicou há algum tempo uma reportagem sobre o estado actual do mercado livreiro. Como seria de esperar, a crise económica está já instalada nas livrarias e editoras, apesar de não ser consensual a sua aceitação. Célia Henriques, da Bertrand do Chiado, refere que “vende-se muito menos agora do que há um ano”. A mesma sensação tem a Fnac, que já sentiu as quebras de venda no último Natal. João Alvim, administrador da Editorial Verbo, afirma sem problemas que “há uma crise no sector desde meados de 2008”. Afinando pelo mesmo diapasão, Manuel Valente, da Porto Editora, desabafa que “muitos livreiros se queixaram de uma quebra de vendas e que os intermediários estão a ter mais prudência na compra de novidades”. Porém, muitos agentes do sector do livro não admitem, ainda, a crise, preferindo não falar em números. António Lobato Faria, da Oficina do Livro, é mais radical e antecipa um futuro negro, quando afirma que “os livros não são imunes ao que se passa com os rendimentos das famílias, pelo que, se este ano editarmos da mesma maneira que no passado, é o desastre”. Mais optimista é o argumento de Jaime Bulhosa, da editora Pó dos Livros: “o mercado vai sofrer menos com a crise porque as pessoas ficam mais em casa e têm mais tempo para ler”. O Expresso voltou à carga a semana passada insistindo na ideia de edição livreira desmesurada. Basta uma ida semanal à livraria Bertrand para constatar o volume desproporcionado de novos títulos nos escaparates.
Como complemento a esta temática, talvez valha a pena ler um livro sintomaticamente intitulado “Livros de Mais” (Temas & debates), de Gabriel Zaid, que vai ao encontro à ideia de que o excesso de produção editorial em Portugal é um paradoxo. Este livro vai mais longe e explora os paradoxos da edição mundial, as virtudes e inconvenientes da abundância editorial a nível planetário. O autor refere que, no fim de cada ano, existe mais de um milhão de títulos novos nas livrarias e bibliotecas, o que equivale que, a cada 30 segundos, um livro novo é colocado à venda em qualquer mercado livreiro do mundo. O negócio frenético em volta do negócio editorial envolve múltiplas variáveis, e urge saber se o leitor mais sôfrego consegue, minimamente, acompanhar as novidades editoriais. Claro que não consegue. Mesmo o leitor mais compulsivo e atento ao mercado só conseguirá ler, durante toda a sua vida, uma ínfima parcela de livros do bolo geral. É a eterna angústia do leitor. Haverá sempre milhares de livros que lhe interessam mas que, por falta de tempo, disponibilidade e dinheiro, nunca conseguirá lê-los. Este livro de Gabriel Zaid vem de certo modo, complementar um ensaio do célebre crítico literário Harold Bloom, intitulado “Como Ler e Porquê” (Editorial Caminho, 2001), o qual partia da seguinte premissa: “Não há uma forma única de ler bem, apesar de existir uma razão fundamental para ler. A informação é-nos infinitamente disponível, mas onde poderemos encontrar a sabedoria?” Aí está o cerne da questão.
PS – E já agora, para quando uma feira do livro digna na cidade da Guarda?
Por: Victor Afonso