Arquivo

Licenciado em quê?

Menos que Zero

A candidatura ao Ensino Superior é um momento importante, pelo que é normal os candidatos sentirem um certo nervosismo na hora de escolher o curso em que pretendem ingressar. Uma boa forma de aliviar a tensão é consultar a listagem de licenciaturas disponíveis no Guia de Candidatura e soltar sonoras gargalhadas quando se descobre que existem cursos como Guias da Natureza, Técnicos Superiores de Justiça, Turismo, Lazer e Património, Arquitectura de Design de Moda, Negócios Internacionais, Tecnologia Veterinária, Enfermagem Veterinária, Equinicultura, Ecoturismo ou Educação e Intervenção Comunitária.

Em Portugal existem 825 designações de cursos quando o normal seria uma centena. Na área de Engenharias, por exemplo, a oferta chega às 133 designações, embora a Ordem dos Engenheiros apenas tenha 12 colégios de especialidade. Outra área onde se verificou o milagre da multiplicação dos cursos é a de Gestão e Administração, onde as três ou quatro designações tradicionais deram origem às actuais 111.

Numa luta desesperada pela captação de alunos, as escolas inventam designações onde os termos saúde, comunicação, tecnologias, informática ou design são combinados de forma mais ou menos habilidosa. Muitos destes cursos são criados com o objectivo de salvar as escolas, não interessando minimamente se existe corpo docente adequado ou área científica associada. O que importa é atrair meia dúzia de incautos, ainda que a “licenciatura” oferecida se resuma ao treino de algumas habilidades.

Recordo-me de ter ouvido o professor Adriano Moreira dizer que uma licenciatura é apenas uma licença para estudar sozinho. Embora na altura me tenha parecido uma simplificação exagerada, hoje estou de acordo. Efectivamente, a licenciatura não deve ser vista como uma autorização profissional definitiva, mas apenas como uma etapa intermédia conducente à especialização numa área específica.

Portugal devia ter aproveitado a reestruturação em curso para reorganizar a oferta formativa do Ensino Superior num primeiro ciclo com um número reduzido de licenciaturas de banda larga e um segundo ciclo com uma vasta oferta de pós-graduações. Enquanto isto não acontecer, a face mais visível da inovação introduzida pelo Ensino Superior serão os nomes dos cursos e não as patentes registadas ou a investigação produzida.

Por: João Canavilhas

Sobre o autor

Leave a Reply