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João Neca e o mundo do espetáculo

EX-ALUNOS

Que curso frequentou e qual a razão da escolha?

Escolhi Estudos Artísticos. Estou neste momento a terminar o mestrado no mesmo curso. As Artes do Espetáculo, o Teatro, sempre fizeram parte das minhas brincadeiras de menino, mas a minha ideia quando escolhi Humanidades no 10º ano era a Licenciatura em Direito. No fim do 12º ano, numa das promoções que as Universidades fazem junto das Escolas, chegou-me às mãos uma espécie de marcador de livros com o Charlie Chaplin na capa que dizia “Estudos Artísticos – Faculdade de Letras da Universidade de Coimbra”.

Que experiências pós-curso o levaram ao mundo do(s) espetáculo(s)?

Comecei a fazer Teatro amador aos 5 anos antes de saber o que era Arte, estética ou representação. Abracei esta forma de expressão artística em condições muito particulares: a Vela, a aldeia onde resido, tem uma tradição teatral, diria, quase ancestral. O meu pai entrava no espetáculo “Taverna (En)Cantada” bem como os pais dos meus amigos todos. Fazer Teatro era uma forma de ficar até mais tarde a brincar na rua.

Como surgiu a ideia do “Gambozinos e Peobardos”? Qual a sua função/cargo no grupo?

A “Taverna (En)Cantada” durou 10 anos. Estávamos todos mais crescidos, atentos a outras realidades e com vontade de inovar. A partir do stand up de “Gato Fedorento”, construímos o “Espetáculo do Riso”, experiência non-sense muito profícua mais do que artisticamente, na amizade. Consolidámo-nos. Desde 2005 contamos com 9 espetáculos. Respondendo à segunda questão, sou um membro como os outros, mas infelizmente o único que seguiu esta área. O mundo artístico carrega uma bagagem de preconceitos e desconfianças consigo. E é uma bagagem bem pesada. Felizmente tenho uma estrutura familiar coesa e compreensiva que percebeu que a felicidade e a realização pessoal têm um papel decisivo na formação. Agarrei-me à minha paixão. É a única forma de estar motivado e entregar-me às minhas obrigações a 150%.

Ao que sabemos os espetáculos realizados até hoje pelo grupo partem da obra de autores portugueses. Porquê a preferência?

É uma questão interessante. Na verdade, o Teatro é sedução. Um jogo de prazer não-carnal. Um autor ou um texto anda às vezes anos na cabeça dos encenadores à espera que surja o momento certo para aquele beijo roubado e a partir daí a mais que natural rendição. Os nossos processos são menos morosos mas nem por isso mais simples. Eu, por exemplo, já não consigo ler um livro, romance, conto, poesia, sem pensar numa possível teatralização. E os fantasmas crescem cá dentro. Chega sempre a hora de os exorcizar. Tem sido em português pelo dissecar da palavra. Pela intertextualidade total. Por acharmos que a nossa língua é menosprezada e os nossos autores poucos divulgados e caídos no esquecimento em troca da industrialização editorial e livreira.

Que projetos para o futuro quer a nível profissional, quer a nível pessoal?

Para já é sobreviver a 2012. Um poeta alemão, Heinrich Heine, dizia que “where books are burned, in the end, people will burn.” E Almeida Garrett dizia que o Teatro é um meio de civilização mas não prospera onde a não há.” A grande probreza, dívida, crise, défice deste país é a falta de cultura. Pode não pôr pão na mesa, mas quando ralharem, em vez de nenhum ter razão, encontram-se soluções. O desafio para alguém que acabou a sua formação agora é lutar contra tudo isto. Felizmente o TMG vai-me dar a oportunidade para aplicar o que aprendi. Irei encenar um espetáculo com poemas de Miguel Torga em março do próximo ano aqui na Guarda. Depois veremos. A escrita poderá ser uma das saídas possíveis e pondero ainda mais uma formação nessa área.

O que recorda dos tempos da Afonso de Albuquerque?

É um sítio onde não voltei a partir do momento em que saí no 12º. Para mim o Liceu tem um tempo e o espaço próprio que foi o meu e daqueles com quem partilhei os 3 anos que passei lá. Foram grandes momentos sempre vividos como uma espécie de interposto para outra coisa. São anos em que se sonha com tudo menos com a Guarda. Sonha-se com os 18 anos, com a carta, com uma namorada, com a Universidade, com as festas académicas, mas isto tudo vive-se nessa escola. Outro dia falava com alguns amigos com quem ainda mantenho contacto, e dizia que são memórias que queremos guardar muito no fundo do baú, por terem sido tão intensas. Acho que ainda não temos idade para dizer que sentimos saudades.

João Neca e o mundo do espetáculo

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