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Inventem-se novos políticos

Menos que Zero

Estamos entregues à bicharada. É este o único pensamento que me assalta quando confrontado com dois acontecimentos que marcaram a política caseira nas últimas semanas.

Comecemos pela renúncia de Maria Elisa ao seu lugar na Assembleia da República. A ex-deputada deslocou-se ao Fundão com uma missão impossível: explicar as razões que a levaram a abandonar o lugar. Resumidamente, Maria Elisa disse que deixa de ser deputada devido às dificuldades que o país atravessa. É, evidentemente, uma razão válida para que um vulgar cidadão abandone Portugal, mas deixa de o ser quando esse cidadão é um político. Isto porque, caso a senhora não saiba, a razão pela qual votamos em determinadas pessoas é, justamente, para que elas tomem medidas que permitam à população viver bem no seu próprio país. A ex-deputada não percebeu isso, como nunca percebeu qual o seu papel na Assembleia da República, já que passou todo o mandato envolta em polémicas relacionadas com o seu desejo de acumular a função de deputada com outra qualquer.

Pior do que suportar as desculpas esfarrapadas da ex-deputada, foi assistir ao exercício de masoquismo protagonizado pelos companheiros de partido que, na hora do adeus, tentaram justificar o injustificável. Pelo menos ficámos com uma certeza: é tudo farinha do mesmo saco.

O outro acontecimento político, que referi no início, também envolve um deputado eleito pelo distrito de Castelo Branco, José Sócrates, e relaciona-se com a inauguração do Estádio do Dragão.

Mota Amaral, presidente da Assembleia da República e, portanto, segunda figura da hierarquia do Estado, foi excluído da lista de convidados para a inauguração do novo estádio do Porto. Tudo porque fez aquilo que lhe competia: marcar falta aos deputados que, em dia de trabalhos parlamentares, se deslocaram a Sevilha para assistir à final da Taça UEFA. O problema nem é o “não convite”, pois isso fica ao critério do anfitrião. O que me choca é o facto de alguém ligado ao FC do Porto ter tornado público que Mota Amaral não era convidado, tentando assim colocar o clube acima do próprio Estado. Esperava-se uma reacção firme dos deputados, recusando os convites que lhes foram endereçados pelo clube. Mas não. De uma forma subserviente e humilhante, alguns deputados, entre os quais José Sócrates, marcaram presença na inauguração do Estádio do Dragão, dando assim força à atitude grosseira do presidente do Futebol Clube do Porto e mostrando mais uma vez que política e futebol são, em Portugal, actividades da mesma cepa. Num país decente, nenhum político – mesmo que adepto portista – se deslocaria à inauguração do estádio.

A história resume-se, afinal, de uma forma simples: o presidente de um clube fez gato-sapato dos políticos e alguns deles, imagine-se, ainda aplaudiram. Mas cuidado: os políticos que andam de braço dado com os homens do futebol nunca devem esquecer que neste desporto se vai de bestial a besta num ápice.

Por: João Canavilhas

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