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Inquérito a incêndio de Famalicão arquivado

Ministério Público sustenta ter havido «precipitação» dos bombeiros, sobretudo do comandante operacional, que «não estudou, com certeza, como mandam os manuais»

O arquivamento pelo Ministério Público (MP) do inquérito ao incêndio negligente que, em Julho de 2006, vitimou um bombeiro português e cinco sapadores chilenos não causou surpresa em Famalicão da Serra e na corporação dos voluntários de Gonçalo. «Este desfecho era de prever pelo que se foi ouvindo nos últimos meses», admitiu o director da secção local e presidente da Junta de Freguesia, que só lamenta a perda de vidas humanas.

«É como em todos os incêndios, a culpa morre sempre solteira», acrescentou António Fontes, esclarecendo não pretender pôr em causa o despacho do MP. «Trata-se de uma decisão do juiz e quem sou eu para a discutir», sublinhou. Também Orlindo Cabeças estava à espera do arquivamento. O comandante dos bombeiros de Gonçalo, a que pertence a secção de Famalicão, garante que nunca se poderia inculpar quem operava a motorroçadora que esteve na origem do fogo. «O que aconteceu foi acidental. O rapaz só andava a cumprir ordens, o mais que se poderia fazer era castigar quem realmente mandou fazer o trabalho, e esse sim é que era responsável, uma vez que é engenheiro florestal», considerou o comandante. No despacho, citando as conclusões do inquérito mandado fazer pelo Ministério da Administração Interna, o MP considera que o incêndio teve origem «meramente acidental» e que não houve «comportamentos censuráveis» por parte de Tiago Gonçalves, na altura com 18 anos. O jovem andava a limpar um terreno agrícola num dia em que o termómetro subiu aos 33 graus centígrados e a humidade relativa foi de 24 por cento, mas o procurador subscreveu as afirmações do dono da propriedade, que afirmou que o Verão é a época do ano «mais apropriada» para limpar terrenos e defendeu que «não é previsível» que faíscas de motorroçadoras sejam causadoras de um fogo.

No entanto, assim aconteceu quando aquele utensílio embateu numa pedra e despoletou um incêndio que consumiu 544 hectares e vitimou os seis homens. Tiago Gonçalves foi detido nesse mesmo dia pela GNR e constituído arguido, por suspeita da autoria de fogo negligente, enquanto o proprietário da quinta, um engenheiro florestal no Núcleo Florestal da Beira Interior Norte, só foi ouvido como testemunha. A par do inquérito, as suas declarações terão sido determinantes para o MP, pois o magistrado acabou por destacar os seus «30 anos de experiência na área florestal», além dos esforços do engenheiro e do jovem para conseguirem controlar o incêndio. Em contrapartida, a actuação dos bombeiros foi criticada, já que o despacho sustenta ter havido «precipitação», sobretudo por parte do comandante operacional, que «não estudou, com certeza, como mandam os manuais». Uma posição refutada por António Fontes: «As coisas estiveram a funcionar bem até às 16 horas, quando ocorreram as mortes, depois houve realmente um descontrolo total no terreno», reconheceu. A este propósito, o presidente da Federação de Bombeiros do Distrito da Guarda adiantou que o incêndio de Famalicão tem sido «um exemplo para que os erros cometidos não voltem a repetir-se no futuro».

Madeira Grilo disse também esperar que «este ano, o equipamento de defesa e protecção individual já possa ser utilizado por todos aqueles que combatem os fogos florestais». Faleceram no incêndio cinco sapadores chilenos, com idades entre os 22 e 30 anos, que faziam parte de uma equipa helitransportada da Afocelca, sediada na zona de Penamacor, e o bombeiro Sérgio Rocha, 26 anos, residente em Famalicão da Serra, que integrava a Iª secção avançada dos Bombeiros de Gonçalo.

Luis Martins

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