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Infractor admite ter mentido à BT para seguir viagem

Alegações finais no julgamento de Cruz Ribeiro marcadas para dia 26

O condutor que entregou ao antigo comandante do destacamento da Guarda da Brigada de Trânsito (BT) uma máquina fotográfica, no valor de cerca de 4.000 euros, para poder seguir viagem para França e não pagar uma multa, de 35 a 135 euros, confirmou quinta-feira o acordo com Cruz Ribeiro. Ouvido no Tribunal da Guarda por videoconferência, por se encontrar em Lanzarote (Canárias), Átila Sbruzi, fotógrafo profissional de nacionalidade brasileira e residente em França, negou ainda que a sua esposa estivesse em trabalho de parto na altura em que foi autuado no IP5 por transpor um duplo traço contínuo e confessou nunca ter pago a coima nem recuperado o material.

O agora major Cruz Ribeiro, sub-comandante regional da BT de Lisboa, está a ser julgado pelos crimes de denegação de justiça, prevaricação e peculato. Na origem do caso está a denúncia de um sargento da Guarda Nacional Republicana (GNR), assistente no processo interposto pelo Ministério Público (MP), e uma máquina fotográfica de que o oficial se apropriou alegadamente após tê-la recebido como garantia do posterior pagamento de uma multa aplicada àquele cidadão estrangeiro em Outubro de 1995, que invocou não ter dinheiro para pagar a contravenção. O problema é que o condutor pôde seguir viagem sem problemas – quando o Código da Estrada determina a apreensão do veículo em situações idênticas – e nunca liquidou a referida coima, supostamente paga pelo próprio Cruz Ribeiro na Direcção-Geral de Viação (DGV) da Guarda em Julho de 1996. Praticamente nove anos depois, Átila Sbruzi confessou ter mentido aos agentes da BT quando invocou o estado de saúde da sua esposa, pois o que queria era «seguir viagem». Explicou, além do mais, que não lhe parecia «justo» ficar na Guarda durante um fim-de-semana «por uma infracção daquelas».

Por isso propôs deixar a máquina fotográfica, uma vez que era a «única coisa» que tinha disponível: «Era uma garantia de que pagava a multa quando chegasse a França e me devolvessem o equipamento», recordou. O problema é que o fotógrafo não se lembra de ter pago, mas recorda-se de ter pedido a devolução do equipamento sem nunca obter resposta da Guarda. O tribunal ouviu também o cabo Manuel Pinheiro, agente que autuou Átila Sbruzi, que, pressionado pelo advogado de acusação, David Catana, em representação do sargento Paulo Costa, acabou por admitir que terá sido enganado com a desculpa da gravidez da mulher do condutor. Por sua vez, José Mendo, director de Viação da Guarda, disse ter estranhado o facto de um agente da BT ter ido àquele serviço pedir uma guia de pagamento muito depois de expirado o prazo de liquidação da coima. Aquele responsável esclareceu ainda que, à luz da lei vigente, o infractor ficava com o veículo apreendido até pagar a coima, ou então tinha que depositar «cinco vezes o mínimo da multa como caução» para poder seguir viagem. O que também não aconteceu.

Por outro lado, José Mendo classificou de «anómalo» qualquer pagamento voluntário posterior ao auto para os não residentes: «Se soubesse isso não tinha passado a guia», garantiu, confirmando que os documentos do veículo também não foram enviados para a DGV, como acontece normalmente quando os veículos são apreendidos. O major António Almeida, actualmente comandante interino do grupo territorial da Guarda da GNR, foi a primeira testemunha abonatória ouvida em sede de julgamento. O oficial recordou a «confusão» das normas e procedimentos existente na altura sobre esta matéria, «o que dificultava a actuação dos agentes», e garantiu que teria agido da mesma forma que Cruz Ribeiro: «Ele agiu com a convicção de que o cidadão em causa estava a viver um drama. Eu teria feito o mesmo, ainda que soubesse que estava a cometer um crime de denegação de justiça», sublinhou. O julgamento prossegue dia 26 com a inquirição de mais testemunhas abonatórias e as alegações finais.

Luis Martins

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