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Indicadores (II)

A Espanha afirma-se galhardamente, a despeito de todos os seus regionalismos – aliás potentes –, Portugal vai vendo onde “páram as modas”, não obstante poder reclamar-se o crédito de homens com horizontes verdadeiramente excepcionais.

Com efeito, desde artistas e empresários e cientistas, não é difícil trazer para aqui nomes: Lima-de-Faria, o número um da Genética a nível mundial, Prof. Emérito em Lund (Suécia); Manoel de Oliveira, o “sagitário” quase centenário; José Berardo, com um protagonismo impressionante; Henrique Neto, uma figura cimeira no seu ramo a nível mundial; e Pinho Vargas, Maria João Pires, Nadir Afonso, Paula Rego (o, para mim, “abominável” que produz não me inibe de reconhecer a sua, digamos, popularidade), Siza Vieira, etc, etc, etc. (O rol surgiu-me ao acaso).

E uma palavra de destaque especial a todas as personalidades ligadas ao Museu do Oriente, as quais souberam, enquanto estiveram em Macau, suscitar a base de uma colecção de arte sem paralelo a nível mundial e fazer da Fundação uma das maiores 20 fundações europeias.

Relativamente a esta última questão, o leitor ficará melhor inteirado da realidade se lhe disser que a muito exclusiva TIME lhe dedica uma página na sua edição de 14-IV-08. E é obrigatório visitar este museu.

É questão ainda não totalmente esclarecida para mim como é que um país com uma tão forte consciência da identidade nacional, afinal se afirma por individualismos. Orgulho profundo na sua própria história? Débeis governos ao longo da História? Camões foi premonitório? Explico-me melhor.

Falar de Portugal sem conhecer o carácter profundamente empreendedor e realizador dos seus filhos não só não pode ser levado a sério, como é letal para quem é ludibriado por tal discurso. É o discurso de intelectuais tipo José Pacheco Pereira, v.g. – e não o menciono para o depreciar, claro, mas como exemplo patético de quem se esforça mas, bem entendido, não possui as devidas bases.

E o carácter profundamente empreendedor e realizador está em que mais que darem «novos mundos ao mundo» os nossos compatriotas realizaram gigantescos e idiossincrásicos mundos.

Tive a sorte de viver em Angola, onde fui oficial miliciano, mais que dois anos; e o conhecimento in loco é um rochedo infranqueável. Mais. Nos transactos dias 4 e 6, por altura das minhas refeições no hotel, pude conversar com angolanos da selecção de futsal, os quais vieram à Guarda participar em torneio da modalidade.

– Confirmei o que já sabia. Aqueles mestiços e negros abraçam-se como se fossem nossos irmãos; e a intensidade deles para connosco é recíproca. Assim, tal qual. Mais. O que escapa a muitos desses intelectuais que passam por ser fautores de opinião é a emoção. A sua razão trabalhou um conjunto de dados que lhes permitiu um discurso entendível, mas o resultado é um arremedo da realidade.

O transmontano ou beirão (apenas dois exemplos, já se vê) que desbravou Angola – mesmo que de muito humildes origens ou letras –, ao lado do licenciado, erudito ou engenheiro, sempre se situou como alguém que vivia no Paraíso.

A intensidade afectiva com que olhavam para aquela terra – e que recebiam em troca – galvanizaram-nos em absoluto. Depois, o que aconteceu em 1975, foi um trauma insuperável. Ignorantes por mais que um motivo, os intelectuais nunca entenderão isto.

Não se trata de uma defesa do colonialismo. A saída dos portugueses de Angola e etc. resultou tão-só do facto de ser ela consequência da convergência de interesses dos norte-americanos e soviéticos. E o reverso da medalha da acção portuguesa é nítida: uma quantidade de lusos aí radicados desprezava (por clara ignorância), a regra básica da felicidade e do porvir – sem generosidade para com os outros atraímos para nós todas as calamidades. Ora, a infame exploração do nativo era a regra. Não foi reversível dada a intervenção da conjuntura política a nível mundial – a começar pela ONU… – e, nomeadamente, das citadas super-potências.

Os sucessivos governos pós-25 de Abril nunca conseguiram crescimento económico além dos 3,5% enquanto que, durante dezenas de anos a fio, com Salazar, o crescimento situou-se entre os 6 e 7%; e estamos onde sabemos muito mais por incompetência indígena do que pela conjuntura internacional. O resultado é claro: Portugal é novamente país de emigração. Em Luanda, dizia-me há semanas um amigo, existe já a “Casa da Guarda” (egitanienses que para lá se têm deslocado ultimamente).

Intelectuais e políticos cujo saber nunca passou de livros, salões, gabinetes e academias, com irrestrita audiência, digamos, na comunicação social, pelos vistos não têm aptidão para dar-se conta de que quem hoje constrói as pontes e ajuda a desenvolver os novos países são, precisamente e por exemplo, os que lá fizeram a guerra e não, justamente, os “iluminados” que, antanho, se eximiram ou desprezaram África.

Está já claro que não é saudosismo nem defesa do colonialismo. O amor que aqueles, como soldados ou, hoje, trabalhadores e/ou investidores, sentiram por aquela terra continua a afirmar-se altaneiramente.

É um emocionante indicador da lusa grandeza.

Guarda, 13-VII-08

Por: J. A. Alves Ambrósio

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