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Idade Média

Um dos melhores “mails” que recebi nos últimos tempos dizia apenas isto: “Na última semana beatificámos um papa, casámos um príncipe, fizemos uma cruzada e matámos um mouro. Bem-vindos à Idade Média!”

O regresso à contemporaneidade não trouxe nada de melhor: um ex e possível futuro ministro das finanças desclassificou as perguntas que os jornalistas lhe faziam ao nível do interesse e relevância atual dos pêlos púbicos (zero, a crer nos mails que alguns amigos me fazem chegar regularmente). Ainda a esse nível, tivemos a prisão do mais alto responsável do FMI por ter tentado sodomizar uma empregada de hotel. Outro meu amigo, com um sentido de humor algo escatológico, não tardou em notar que a criatura tinha já feito o mesmo a dez milhões de portugueses, e impunemente. Houve logo outro a retorquir que, quando cá chegou o FMI, já o mal estava feito há muito e por outros: os candidatos a futuro primeiro-ministro. Outro ainda, e ninguém o contradisse, foi dizendo que, embora houvesse graus variáveis de culpa, ele conseguiria identificar pelo menos dez milhões de responsáveis pelo estado a que “isto chegou”.

Entretanto, não há um candidato a ministro, ou a primeiro-ministro, que consiga dizer alguma coisa que nos possa tranquilizar. Ouvimo-los falar e desconfiamos que ou não percebem nada do assunto ou percebem demais e estão a esconder-nos os factos mais relevantes. Pelo seu passado e experiência nada há que garanta seja o que for de bom. Dos restantes políticos e comentaristas também não. Medina Carreira tem estado calado, António Barreto falou há pouco, mas para pouco mais do que pedir a responsabilização criminal de Sócrates.

É verdade que Cavaco Silva, num momento de lucidez, disse (ou deveria ter dito) que a saída para a crise só é possível trabalhando mais, gastando menos e comprando produtos portugueses. Poderia também ter dito que deveríamos contar menos com o Estado e mais com as nossas próprias capacidades, e que deveríamos tentar corrigir asneiras que ele cometeu enquanto primeiro ministro apostando na agricultura, nas pescas e reduzindo o tamanho e o peso do Estado – mas isso seria pedir de mais.

Outros, à esquerda, vão perdendo credibilidade a cada palavra que dizem. As propostas de Francisco Louçã e Jerónimo de Sousa estão quase ao nível das avançadas por Alberto João Jardim. Basta baixarem um pouco mais de nível. De resto defendem basicamente o mesmo: gastar sem olhar a meios, que alguém pagará um dia a conta.

Era um bocadinho isto, a idade média: um estado pulverizado, sem uma ideia de conjunto, egoísmos desencontrados, gente mal preparada, venal, ignorante, a fingir dar algum sentido ao todo e a usar truques baratos para conseguir o apoio da populaça.

Por: António Ferreira

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