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Humanizar e Reorganizar

Crónica Política

Recentemente, assisti a uma comunicação do coordenador das paróquias da Guarda (Sé e São Vicente), revelando, com preocupação que, neste ano, nestas freguesias e paróquias urbanas, os funerais foram mais do que os baptizados.

Tendo em conta que se trata de um meio marcadamente católico, será legítimo concluir que, nestas freguesias, os óbitos terão sido mais do que os nascimentos.

É do conhecimento público que, nos últimos anos, a Guarda (cidade) assistiu aos aumentos da sua população, à custa da desertificação das freguesias rurais.

Neste momento, é preocupante, depois de assistirmos ao abandono dos meios rurais, e à sua consequente desumanização, passemos assistir à diminuição populacional do meio urbano, para o que não deixará de ser indiferente o desemprego a que se têm visto votados, nos últimos tempos, muitos casais, alguns deles, jovens.

Estes factos provocam a desumanização e impõem novos modelos e paradigmas de organização humana e social.

A igreja (a diocese da Guarda), face a esta incontornável realidade e, perante a escassez dos seus membros, avançou já, no terreno, com a reorganização da gestão das paróquias.

Sob o ponto de vista administrativo, muito se tem falado e escrito sobre a necessidade de um novo modelo de organização e gestão das freguesias.

Como se pode ler num estudo coordenado pelo Professor Augusto Mateus, “todas as reformas em Portugal têm sido boicotadas pelos interesses partidários”. Referindo-se ao concelho de Lisboa, o documento propõe um novo mapa de freguesias.

Os autores do estudo propõem a junção de freguesias mais pequenas e a divisão das unidades de maior dimensão. “São Nicolau, por exemplo, tem 1.200 habitantes, e nem sequer é a freguesia mais pequena da cidade, enquanto os Olivais contam com mais de 46 mil. É maior do que o conjunto dos municípios de Castelo Branco e Vila Velha de Ródão” e do que o próprio concelho da Guarda, acrescento.

Como observa Augusto Mateus, “Não podemos governar grandes concentrações urbanas da mesma forma que governamos pólos rurais. Não posso ter uma freguesia com menos de 400 habitantes com as mesmas regras de uma com mais 60 mil.”

As freguesias são uma realidade constitucionalmente consagrada e reconhecida, com riqueza cultural e identidade próprias, caracterizando-se por ser quem, na Administração Pública, mais próximo está dos cidadãos – mais-valia incontornável -, sendo cm consequência, agente privilegiado na resolução ou procura, promoção e encaminhamento das melhores soluções para os problemas das comunidades locais e dos seus cidadãos.

Face ao decurso da “reforma administrativa” que impôs maiores obrigações legais, consagrando novos sistemas de regras que se revestem de uma linguagem jurídica também inovadora, nem sempre de fácil interpretação, não é fácil a muitos leitos locais, com estruturas bastante incipientes, responderem a tais exigências, tendo em conta um nível da Administração com parcos recursos, técnicos e humanos, contando na maioria dos casos, com o trabalho abnegado e altruísta dos seus eleitos.

É importante reunir e sistematizar os conhecimentos e os modelos de intervenção na área administrativa das freguesias atendo às exigências relacionadas com competências, funcionamento dos órgãos, estatuto dos eleitos locais, gestão de recursos humanos, contratação pública, sistema de controlo financeiro das autarquias (POCAL), de forma a assegurar o bom funcionamento das estruturas das freguesias, pois, embora sejam muitas vezes menorizadas, está mais que provado que as freguesias fazem bem mais com muito menos e que são o primeiro patamar da democracia e a quem os cidadãos recorrem em primeira-mão.

Importa repensar, com estudos adequados qual o modelo de gestão para estes tipos de freguesias, considerando que freguesias que possuem densidade populacional inferior a 100 h/km2, ou que integrem um lugar com população residente inferior a 2.000 habitantes, são consideradas freguesias rurais, as quais clamam por especial atenção, sob pena de o interior ser cada vez mais interior, transformando-se e terra de ninguém (há povos, com história e com vivências seculares, em vias de extinção nos próximos 10 anos!).

Por: Manuel Rodrigues *

* presidente da concelhia da Guarda do PSD

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