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Haja Fé

Corta!

Já foi comprado pela RTP e até já chegou a estar prevista a sua passagem no canal público de televisão, mas tal nunca chegou a acontecer. O realizador é brasileiro e dá pelo nome de Neni Glock mas o assunto nele retratado é bem português: Fátima, e tudo o que gira à sua volta. O documentário chama-se A Fé de Cada Um e foi agora exibido pela primeira vez em Portugal no festival Panorama – Mostra do Documentário Português, que decorre até Domingo no Fórum Lisboa.

Através de três diferentes pontos de vista, ficamos a conhecer os vários lados de um culto que tem tanto de grandioso como de polémico. Se por um lado se acompanham os grupos de peregrinos, podendo ver todo o folclore que envolve tais peregrinações, muito longe da reflexão exigida e onde sofrimento e alegria se acabam por confundir, num vazio aos olhos de todos, onde apenas as aparências parecem interessar (a foto no fim da viagem e não a viagem em si); por outro lado, acompanhamos um pagador de promessas, que em troca de alguns euros se faz substituto de quem não pode ou não quer fazer uma peregrinação prometida, acabando até por ser este, a soldo, a conseguir tirar maior proveito de tal peregrinação, através de um percurso à margem do espalhafato dos grandes grupos. A completar o trio, não poderia deixar de estar a polémica provocada por alguém que vem do interior da própria Igreja. Um padre, de opinião suficientemente polémica para que a Igreja o tenha expulso. Defensor de uma tese em que Fátima não passa de uma criação da Igreja, totalmente inventada e que vai contra os próprios princípios defendidos na Bíblia. Milhares de pessoas a acenar para um boneco (as palavras não são minhas) como acontece duas vezes por ano no Santuário de Fátima, não são, para este, sinal de fé, mas antes prova de uma alienação colectiva, que a Igreja faz tudo para alimentar. Afinal, talvez as diferenças entre a religião católica e algumas seitas acusadas por tudo e todos, não sejam assim tantas. A juntar a isto, todo o sofrimento de várias pessoas, arrastando-se dolorosamente em voltas intermináveis ao dito santuário. Como se o Deus por elas adorado fosse um qualquer sádico. Alienação e sadismo, nada mau, nada mau mesmo.

A estrutura conseguida por Neni Glock é eficaz, atingindo um forte equilíbrio entre as três diferentes perspectivas apresentadas, com uma progressão constante que não deixa nunca cair o documentário na repetição ao longo da sua quase uma hora de duração. Todos os minutos são aproveitados. Como referi no inicio, a RTP já o tem em sua posse, haja fé para que a sua exibição se concretize e que se possa assim ajudar num abrir de olhos e mentalidades, que tanta falta fazem.

Por: Hugo Sousa

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