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Habitantes de Aldeia Rica andam quilómetros para ir ao cemitério

Obras da auto-estrada entre Celorico da Beira e Bragança limitam acesso aos habitantes da anexa de Açores desde Março deste ano

A população de Aldeia Rica, anexa de Açores (Celorico da Beira), tem sido obrigada a percorrer quilómetros para ir ao cemitério local. A situação acontece desde Março deste ano devido à construção do troço de auto-estrada da concessão Douro Interior, entre Celorico e Bragança. O dia de finados foi este ano mais penoso para quem quis lembrar os familiares falecidos.

Com as obras da auto-estrada, o caminho mais próximo, cerca de 100 metros, para o cemitério foi interdito e os residentes só desde sexta-feira deixaram de percorrer oito quilómetros para lá chegar. A situação arrasta-se desde Março e a promessa de conclusão de uma ponte – ali tão perto – de ligação para Açores permanece adiada. Outras duas já foram iniciadas, estando separadas por cerca de 600 metros, mas até à passada sexta-feira nenhuma estava concluída e o cemitério – ali mesmo em frente – continuava distante. Neste momento só é acessível através da segunda ponte – “aberta” á população na sexta-feira – que dá acesso a Açores (cerca de 6 quilómetros de distância) ou por um caminho de terra batida que a chuva transformou em lamaçal (cerca de 2,5 quilómetros a pé). Todo este transtorno tem revoltado uma população marcadamente envelhecida e fortemente religiosa e arreigada às tradições. Francisco Silva foi dos habitantes mais activos nesta “causa”. «Chamei a atenção do presidente da Junta, que disse que a situação era só até Junho. Mas em Setembro cortaram todos os acessos e o presidente da Junta disse-me que a ponte mais próxima do cemitério ficaria pronta a 15 de Outubro», recorda.

O habitante questiona a atitude do autarca local que, segundo ele, terá sido novamente interpelado passada aquela data, mas sem qualquer resultado. Francisco Silva considera que Carlos Abel deveria ter feito «mais pressão» para que fosse feita a ponte mais próxima e lamenta o seu «desinteresse»: «Se o presidente da Junta não defende os interesses da aldeia, o que está lá a fazer?», interroga. Por sua vez, António Amaral considera que se trata de «uma situação crítica», que afecta toda a população: «Isto não se fazia, impedir as pessoas de fazer uma visita aos seus falecidos», critica. E nem o caminho alternativo de terra batida depois da ponte parece ser a melhor solução: «Arranjaram um acesso que já deu problemas, pois foi preciso uma máquina para tirar de lá dois carros que ficaram atolados na lama», refere. «Eu já lá fui com o tractor e não consegui passa», acrescenta.

«Perguntei aos trabalhadores por onde passava e responderam-me que teria que ir pelo ar»

O mesmo problema teve Manuel Júlio, para quem esta situação – apesar de provisória – «não se admite». O habitante de Aldeia Rica afirma que certa vez não conseguiu chegar ao seu terreno «para ir buscar as couves» e que neste momento é «muito complicado ir ao cemitério», porque «abriram uma passagem onde ficam os carros atolados. Eu tentei lá passar com o tractor e tive que voltar para trás», revela. Quem está cansada das caminhadas é Maria Bernardo. No domingo foi colocar flores nas campas dos seus familiares e na segunda-feira voltou ao cemitério, «mas foi muito complicado», garante, adiantando que, na semana anterior, também a rega da horta lhe foi barrada pelas obras. «Perguntei aos trabalhadores por onde passava e responderam-me que teria que ir pelo ar. Isso não se admite. E tive que voltar para trás», lamenta. Já Maria José pergunta por onde se vai «se nos morre um ente querido. Vamos com ele ali para a A25?». A resposta vem célere, em jeito de solução: «Acabavam a ponte que dá acesso ao cemitério – que é a principal – e depois acabavam esta», defende, tal como os seus conterrâneos.

Quanto à alternativa de ir à aldeia vizinha, Açores, considera: «Ia melhor por aquela ponte do que pedir a alguém que me leve de carro até Açores». A mesma opinião partilha Elisa Júlio, que explica que a ponte que dista cerca de 100 metros é fundamental, «porque dá acesso directo ao cemitério, onde vão pessoas praticamente todos os dias», declara. No seu caso, afirma que passou na segunda-feira «mais de dois meses» que não ia ao local devido à distância. A propósito desta situação, O INTERIOR contactou a Ascendi, dona da obra, que não respondeu até ao fecho desta edição. Por sua vez, o presidente da Junta de Açores, Carlos Abel, não quis falar do assunto, remetendo explicações para o presidente da Câmara de Celorico da Beira, José Monteiro, que se manteve incontactável até ao fecho desta edição.

Veja a reportagem em: www.ointerior.tv

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Habitantes de Aldeia Rica andam quilómetros
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