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Governo apontado como principal culpado pelo despovoamento

Gouveia, Manteigas e Seia são outros concelhos da região que não conseguem fixar população, pois falta emprego

Continuamos a analisar os dados do despovoamento na região e esta semana chegamos a Gouveia, Manteigas e Seia. Localizados em pleno Parque Natural da Serra da Estrela, o que lhes garante vários pontos de atracção turística pelas suas paisagens, mas isso não é suficiente para demover quem pensa em sair para outras cidades, ou até mesmo outro país.

Gouveia tem hoje menos de metade da população que registava na segunda metade do século XX. Com um crescimento gradual desde 1900, altura em que tinha mais de 24 mil habitantes, o concelho chegou a ultrapassar nos anos 50 os 27.600 habitantes. Mas, há semelhança do que temos analisado nas edições anteriores, o despovoamento começa a desenhar-se em 1960, quando perdeu mais de 2 mil habitantes. O abandono do concelho começou a intensifica-se nas décadas seguintes. A maior queda aconteceu entre 1960 e 1970, pois em dez anos Gouveia perdeu quase 7 mil habitantes. Os últimos dados são de 2015 e não são animadores, registando-se apenas 13.114 habitantes nesse ano.

Em Manteigas, o município mais pequeno do distrito da Guarda, a perda de população é menos abrupta. O século XX começou com 4.052 residentes, mas tal como em Gouveia, o pico de população foi atingido em 1950, com 5.390 habitantes. É a partir daí que o crescimento dá lugar a redução populacional, entrando no século XXI como 4.094 habitantes. Já em 2015, o concelho localizado no “coração” da serra tinha 3.199, tendo perdido quase mil habitantes desde 2001. Apesar de ter dados bem diferentes de Manteigas, Seia não foge ao caminho da desertificação. Se em 1900 tinha 31.020 habitantes, em 1950, mais uma vez o pico, atingiu os 35.962 residentes. Número que tem diminuído desde estão. Em 2015, o município tinha 23.329 habitantes, menos 7.691 que no início do século XX.

Para travar a desertificação, que caminha a passos largos ao longo das últimas décadas, as autarquias reivindicam mais atenção por parte do governo e promovem medidas que fixem os que ainda cá vivem.

Manteigas

Em Manteigas não há dúvidas que são a constante diminuição da taxa de natalidade e o aumento da população como mais de 65 anos, provocando consequentemente a subida da taxa de mortalidade, que «põem em risco a população em idade activa e o equilíbrio estrutural e a sustentabilidade da renovação geracional», adianta o autarca local. José Manuel Biscaia lamenta que «não há e nunca houve uma política demográfica, económica e social de promoção da coesão territorial e social», talvez porque «os Governos retiram mais dividendos eleitorais nos territórios com mais altas densidades populacionais».

O autarca culpa «esta lógica eleitoral, focada no curto prazo e no imediatismo dos resultados». Tal como o homólogo de Gouveia, José Manuel Biscaia desconfia da Unidade de Missão para o Interior, que classifica de «entidade abstrata» e considera mesmo «ridículo» o lançamento do programa “Qualificar” com 10 milhões de euros, «que seria óptimo para relançar uma pequena localidade como Manteigas, mas cuja verba se destina a todo o interior». Na sua opinião, a solução para este flagelo deveria passar pela criação de postos de trabalho, sendo necessário «criar benefícios fiscais substanciais às empresas que se fixem no interior e descentralizar serviços da administração pública, em vez do esvaziamento dos serviços desconcentrados». Embora o edil considere que os municípios da região estão «no limite daquilo que podem fazer», em Manteigas adianta que a autarquia tem promovido alguns apoios sociais para fixar quem já lá vive e atrair novos habitantes. Entre as medidas destacam-se apoios à aquisição de manuais escolares, prémios de mérito escolar, subsídios de natalidade, bem como subsídios para constituição de família e fixação de residência. Apesar de José Manuel Biscais ter «moderadas expectativas» numa evolução positiva da população, o autarca afirma que «não desistimos nem desistiremos da nossa terra nem das nossas gentes».

Gouveia

«Não há nenhuma Câmara que possa fazer o que quer que seja de sustentável para minimizar esta situação, pois não temos meios nem capacidade», começa por dizer o presidente da Câmara de Gouveia. Para Luís Tadeu, «faltam investimentos de vulto na região que proporcionem a criação de centenas de postos de trabalho» e esse é uma tarefa que considera ser da responsabilidade do Estado. «É o Governo que tem capacidade para negociar com grandes investidores e atrair empresas, através de incentivos fiscais. Esse seria um verdadeiro trabalho de discriminação do interior», sublinha.

Se para alguns autarcas existe alguma esperança na Unidade de Missão, o edil gouveense julga que não é mais do que «enganarmo-nos uns aos outros», pois não acredita que as mais de cem medidas definidas possam travar o despovoamento do interior se «faltam medidas concretas». As portagens são um dos alvos das críticas de Luís Tadeu: «Os municípios podem oferecer as melhores condições de instalação a novas empresas, mas não conseguimos reduzir os custos de transporte e isso não atrai as empresas», lamenta. Outra preocupação, além de fixar pessoas, «é sobretudo necessário atrair pessoas novas, já que só assim podemos evitar o encerramento de serviços públicos», justifica o presidente da Câmara.

«As medidas no papel não resolvem rigorosamente nada se não há intenções de fazer nada, como até aqui não tem sido feito. Duas ou três medidas concretas bastavam para fazer a diferença», conclui Luís Tadeu.

Seia

Apesar da «qualidade e da riqueza do território», também tem sido difícil para a autarquia de Seia travar o despovoamento no concelho, «agravado pelo envelhecimento da população», reconhece o presidente senense.

A solução para Carlos Filipe Camelo é fácil de encontrar e consiste em «aumentar as oportunidades de emprego», sendo necessárias «acções do Estado do ponto de vista fiscal que promovam a fixação de empresas», refere o edil. Até aqui, o autarca lamenta que se tenha assistido ao oposto, ao «abandono destes territórios por parte dos governos», o que, por sua vez, «não vai incentivar a iniciativa privada». Em Seia têm sido adotadas «medidas um pouco diferentes de outros concelhos, pois damos incentivos prolongados no tempo – três anos», como o incentivo à natalidade. Também a criação de uma nova zona empresarial, com «uma nova componente comercial e industrial», com capacidade pra atrair outras empresas, faz com que exista uma «ponta de esperança». O futuro ainda é incerto, mas Carlos Filipe Camelo tem uma certeza: «Não desistiremos e persistiremos num objetivo, que é a criação de emprego e riqueza em Seia».

Ana Eugénia Inácio Gouveia tinha em 2015 menos de metade dos habitantes da década de 50

Comentários dos nossos leitores
Mike mikealfa@hotmail.com
Comentário:
O Governo e os autarcas que não tem qualquer visão de futuro, incapazes de criar condições para as empresas se instalarem e correndo com as que existem com IMI, taxas e serviços usurários. O Interior será um deserto total.
 
Miguel l2633539@mvrht.com
Comentário:
Os portagens vieram matar grande parte da dinâmica entre as zonas do interior, enquanto todos nós pagamos os transportes de Lisboa e Porto, Metro CRIL etc…
 

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