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Gaia – A Grande Senhora

GAIA

A ideia de que a Terra é viva é tão velha quanto a Humanidade. Os antigos gregos deram-lhe o nome de Gaia, e tinham-na por deusa.

Acusa-se a tradição judaico-cristã de ter legitimado a implacável marcha da civilização quanto ao domínio da Natureza, começando pelo Génesis, segundo a qual foi concedido ao Homem o «domínio» da Terra.

É uma acusação injusta. Esta tradição defende a responsabilidade ética de cuidar do bem-estar do mundo natural.

Nas Escrituras, a degradação ambiental e a injustiça social caminham juntas. Quando Caim mata Abel, Deus diz-lhe que o sangue do irmão conspurcou o solo, o qual já não lhe dará sustento, mesmo que o cultive para sempre.

Noé fornece igualmente provas da preocupação com a conservação. Hoje, as instruções divinas seriam: «Preservarás a biodiversidade».

José interpretou os sonhos partindo dum significado ecológico. A sua decisão revela a capacidade de prever flutuações climáticas e preparar-se para elas.

Maomé também disse: «O mundo é belo, e Deus nomeou-vos como guardiães dele em Seu nome.». O primeiro califa muçulmano ordenou às tropas: «Não abatam árvores, não abusem dos rios, não façam mal aos animais e sejam sempre amáveis com a Criação».

Já nas religiões dos nativos americanos encontramos: “O que acontecer à Terra, acontece a todos os seus filhos. Ela não pertence ao Homem, o Homem é que lhe pertence… Ele não teceu a teia da vida, é um mero fio dessa teia. Aquilo que lhe fizer, fá-lo-á a si próprio…”

Em cada inspiração há moléculas de ar que Jesus e Hitler igualmente inalaram. Todavia, o ar que respiramos hoje é substancialmente diferente daquele que eles respiraram.

Continuando a ignorar as poderosas alterações que provocamos, podemos extinguir-nos num mistério que intrigue a nova Humanidade dum futuro distante, tentando compreender o que aconteceu a esta civilização que ergueu estruturas de cimento e aço.

Sentimo-nos mais próximos do supermercado que do campo de trigo, prestamos mais atenção às cores do plástico que embrulha o pão do que à destruição do solo donde ele brotou.

Infelizmente somos uma espécie com tendências esquizóides. Como uma velha senhora que partilha a casa com um grupo de adolescentes destruidor, Gaia fica zangada, acabando por expulsá-los caso não corrijam esse comportamento.

por Maria de Lurdes Santos*

* Professora

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