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Futebol de qualidade

Ver sempre que possível. É este o conselho para os que gostam de futebol bem jogado. Independentemente do resultado e de mais ou menos golo, o futebol praticado pelos jogadores do Real Madrid (tive a oportunidade de seguir via TV os jogos com o Mallorca e o Bétis de Sevilha) é do melhor que há. Os jogadores do Real inventam, jogada após jogada, os lances mais inverosímeis que se possam imaginar. A ilusão e o suspense estão presentes a qualquer momento. A criatividade é a palavra de ordem nos planos de acção de cada jogador e da combinação e interactividade entre eles. Ele é o Zidane que, recebendo um passe comprido e tenso de Roberto Carlos, cola directamente no pé e rodopia em seguida sobre o seu adversário fazendo dele uma espécie de “pivot”. Ele é o Figo, que baila à frente dos trocados olhos do seu adversário, que já não sabe para que lado há-de cair. Ele é o Ronaldo, que num pique entre florestas de pernas, se liberta de todas as marcações em poucos metros de terreno. Ele é o Beckham, que, pausando o jogo, levanta a cabeça e de súbito faz sair dos seus pés a bola teleguiada com uma pontaria cirúrgica em direcção à desmarcação rápida de Raúl, que aproveitando o pouco espaço disponível, remata de primeiro, sem deixar cair o esférico, provocando no estádio um bruaaaaaa seguido de uma ovação a toda a escala.

A maneira como o Real Madrid vem jogando é sinal de um aproveitamento das capacidades individuais dos jogadores. Se é verdade que de um lote de grandes jogadores pode não se fazer uma boa equipa (lembro-me do Barcelona de há anos ser assim), também é verdade que é de grandes jogadores que se podem fazer as super-equipas. O Real Madrid da era de Queiroz faz lembrar o Brasil do Mundial de Espanha/82. Dá gosto ver como a técnica pode ser utilizada sem que se perca a objectividade. Dá gosto ver os níveis de concentração dos atletas, nitidamente apostados em dar espectáculo e jogar bem. É um regalo para a vista e um prazer para os sentidos.

Para fazer a antítese temos o futebol para gasto indígena. Hoje, quando escrevo, é jogo do clássico Porto-Sporting. Antevejo um clima de jogo a raiar a violência, cheio de casos (como o do mistério do desaparecimento dos apanha-bolas no Boavista-Guimarães) ou de corridas desenfreadas e saltos de karaté (há quem lhe chame técnica musculada, para mim é tão-somente insuficiência). Aqui as baterias estão exclusivamente viradas para o resultado. Os jogadores têm em mente chegar primeiro à bola, serem mais rápidos que o adversário, mas nada mais do que isso. Jogadas bonitas por jogo são quase zero. É o primado do resultado sobre o jogo jogado, da força sobre a técnica. Joga-se quase sempre em combate contínuo. Será que tem mesmo de ser assim? Será que é fado? Por aqui me fico, deve estar a começar mais um jogo do Real Madrid.

Por: Fernando Badana

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