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Filarmonia das Beiras extinta

Orquestra regional do Centro chega ao fim para evitar risco de «insolvência financeira» no futuro

A Assembleia-Geral da Associação Musical das Beiras aprovou na semana passada a extinção da instituição e da orquestra regional, devido à incapacidade de responder às reclamações dos músicos, que exigiam um regulamento interno e contratos de trabalho. É o ponto final num dos projectos mais dinâmicos da região Centro e que contribuiu decisivamente para a divulgação da música clássica com centenas de concertos. A Beira Interior não foi excepção, tendo sido uma visita regular de salas e igrejas de inúmeras localidades da Guarda e Castelo Branco. Memorável e histórico foi mesmo o recital “Missa para Coro, Solistas e Orquestra”, de João José Baldi, gravada ao vivo na Sé Catedral por ocasião dos 804 anos da cidade e que está disponível em CD, numa edição da Câmara da Guarda.

O fim da Orquestra Filarmonia das Beiras foi deliberado por unanimidade numa reunião extraordinária realizada na última quarta-feira e foi explicada com os riscos de «insolvência financeira futura» da associação, adiantou Vítor Lourenço, presidente da direcção. Desde a sua fundação, em Dezembro de 1997, que a orquestra tem vindo a pagar os salários dos músicos em regime de prestação de serviços (recibos verdes) devido à incapacidade de assumir a contratação efectiva dos artistas. Depois de alguns dos instrumentistas terem interposto acções judiciais a reclamar a celebração de um contrato de trabalho, os associados entenderam extinguir a instituição alegando que «não tem condições» para assumir essas despesas. «Chegámos a um ponto de ruptura que não tinha outra solução», afirmou Vítor Lourenço, também vice-presidente da Câmara de Leiria, salientando que a orquestra tem um orçamento de cerca de 750 mil euros por ano e não reúne condições financeiras para integrar três dezenas de músicos nos seus quadros. Esta decisão vai obrigar à renegociação dos compromissos assumidos para os próximos meses e ao despedimento colectivo dos seis funcionários da associação, os únicos com contratos de trabalho celebrados, acrescentou.

Na semana passada, uma comissão dos 27 músicos sustentou em comunicado que «nunca existiram verdadeiras negociações» devido à intransigência da direcção em aceitar celebrar contratos de trabalho. A direcção terá mesmo chegado a propor que os músicos fizessem nos seus salários os descontos para a Segurança Social, mas mantendo salários elevados para o pessoal administrativo e director artístico, acusam. «É insólito e inexplicável que seis pessoas» custem à associação «200 mil euros (40 mil contos) e que 27 músicos custem pouco mais do dobro», refere o comunicado, recordando ainda que o director executivo viu aumentar o seu salário «em 160 por cento» nos últimos sete anos. «Uma orquestra sem músicos não se concebe, pelo que não se compreende a linha de raciocínio que leva esta direcção a considerar como prioridade o pessoal administrativo em detrimento do projecto artístico», pode ler-se ainda.

Para Vítor Lourenço, os músicos têm «todo o direito à sua entrada no quadro de pessoal» mas essa reivindicação «não pode ser assumida pela associação». Admite, contudo, que a experiência de criação de uma orquestra regional possa ser repetida no futuro mas «com outros moldes legais» para evitar «estes problemas». O presidente lamentou de resto que a extinção da orquestra tenha sucedido num ano em que estava prevista a realização de uma centena de espectáculos, um «número recorde» para uma filarmonia do género. A Orquestra Filarmonia das Beiras era o organismo artístico da Associação Musical das Beiras, instituição que reúne autarquias, universidades e escolas superiores, regiões de turismo, associações culturais e económicas da região Centro. Foi fundada no âmbito do programa governamental para a criação de uma rede de orquestras regionais e estreou-se oficialmente em Dezembro de 1997.

Luis Martins

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