As aldeias da região voltaram a encher-se de vida durante a primeira quinzena de agosto. O regresso dos filhos emigrados na Europa ou dos que vivem no litoral trouxeram, como em todos os verões, a alegria e agitação de outrora. A festa regressou à aldeia. Foi apenas por uns dias. Mas foi tão forte como sempre.
A diferença é que, por todo o lado, o cartaz de animação foi de crise. Mas, ainda assim, ou precisamente por isso, faz sentido destacar o empenho e o engenho com que algumas autarquias promoveram as festividades dos respetivos concelhos. “Quem não tem cão, caça com gato”. Foi assim em Trancoso, onde mais uma vez a Feira de São Bartolomeu, mesmo com menor investimento, se afirmou como o maior evento da região – mais de 30 mil bilhetes vendidos nas noites de espetáculos, isto apesar de um cartaz sem grandes nomes, e milhares de pessoas a visitarem a feira de atividades económicas e a disfrutar do lazer durante o dia. Ou no Fundão, onde as ruas se encheram durante dez dias para desfrutar do Festival Cale, porque ter imaginação e criatividade é muito mais do que gerir um orçamento com ou sem crise. E a seguir, e ainda no Fundão, o teatro está na rua até ao fim do mês, com uma extraordinária atividade: o TeatroAgosto. Ou no concelho do Sabugal, onde o fervor taurino deu luz às festas das muitas aldeias raianas que, por estes dias, têm a magia e a capacidade de atrair as diferentes gerações de filhos na diáspora. Ou em Figueira de Castelo Rodrigo que, com parcos recursos, promoveu várias atividades que contribuíram para que houvesse animação e festa durante muitos dias, para gáudio dos filhos da terra. Ou em Almeida com a Recriação Histórica do Cerco da vila. Ou mesmo em Belmonte, com o esplendor da tradição. Ou em Idanha-a-Nova… Mas foi em Celorico da Beira que houve a mais diferenciadora e expressiva atividade deste verão: o Festival Andanças e as “Danças na Água”. Não é um produto nato – o que confirma que a exclamação de festividade de tradição não tem qualquer relevância, nem significa maior entusiasmo intrinsecamente, o importante é a capacidade de envolver, de ter ideias, de construir um produto pensado para as pessoas. E foi isso que aconteceu na Ratoeira, nas margens do rio Mondego: uma festa despretensiosa, para as pessoas, para satisfação das pessoas (jovens e menos jovens).
Este verão foi especialmente marcante por um outro motivo: os emigrantes ficaram mais dias nas aldeias. Ao contrário de outros anos, em que chegam por dois ou três dias, vão passar uma semana à praia e voltam por mais dois ou três dias, partindo de seguida para os países de acolhimento. Este ano, os emigrantes, conscientes do período de crise em que vivemos e que também já se vai sentindo nos demais países europeus, foram por menos dias para a praia e passaram mais tempo na sua terra natal. Notou-se. Pelo menos nas vilas e cidades onde houve atividades lúdicas e festivas. De fora, completamente de fora, ficou a Guarda. Sem festas, sem animação, sem razões para passear pelas ruas à noite, a Guarda foi uma cidade moribunda e escura (de dia houve sempre muita gente, às compras ou simplesmente a passear, mas com o pôr-do-sol toda a gente partia para as aldeias e vilas das redondezas, para as festas e romarias…). Não tivesse havido o Transblues, em julho, e as esplanadas da cidade teriam passado o verão vazias. Para o ano… vai haver eleições e seguramente haverá o regresso das festas da cidade. Ainda bem. Já não há quem aguente tanta pasmaceira numa cidade capital de distrito. Até lá, deixo uma sugestão de fim-de-semana no Alentejo: o “Festival do Crato vai dar música à crise”, de 29 de agosto a 1 de setembro, com um bom programa (http://www.cm-crato.pt/festivaldocrato/) e bom preço (passe de 20 euros para quatro dias, para ver Mafalda Arnauth e Amor Electro, Cais Sodré Funk Connection e Boss AC, A Naifa e Sétima Legião, e Dead Combo, Pedro Abrunhosa e Buraka Som Sistema), boas razões para ir até lá… assim se animam os da terra e assim se chamam os forasteiros – bom cartaz, boa gastronomia, artesanato genuíno, património e cultura para conhecer. Já que não se faz por cá… vamos aproveitar fora ao preço de crise.
Luis Baptista-Martins