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«Fazer um jornal é uma aventura arrojada mas compensadora»

Cara a Cara – Entrevista

P – O que significa o Prémio Extraordinário de Doutoramento, recentemente atribuído pela Universidade de Salamanca?

R – Foi o culminar de seis anos de intenso trabalho de investigação, fora das horas da minha actividade profissional. Foram anos a fio sem férias ou fins-de-semana e noites em branco ou com poucas horas de sono. A distinção assume, por isso, um significado especial. A realização de um doutoramento é uma corrida de fundo a solo, com avanços e recuos. Com efeito, o dia da entrega do prémio despertou em mim um turbilhão de sentimentos e de emoções. Foi um momento de reconhecimento, com elevado simbolismo.

P – Em que consiste a investigação que desenvolveu?

R – O trabalho seguiu a linha vygotskiana da psicologia genético-cultural e do conceito de actividade significativa. No essencial, levámos por diante um projecto baseado no que de mais importante ocorre no quotidiano do ponto de vista social, político, económico, científico, cultural e tecnológico. Desta forma é possível cumprir com propósito os conteúdos do programa e ultrapassar a perda de actualidade dos manuais escolares. O produto do trabalho é, depois, vertido nas páginas do jornal no termo de cada período lectivo. O objectivo é produzir um jornal de qualidade, na forma e no conteúdo, e não um arremedo de periódico. A formação nos campos educacional e jornalístico é a pedra de toque do sucesso do projecto.

P – Está ligado ao jornal “Desejo de Voar”, da escola de Santa Zita. Como é coordenar um jornal com e para crianças?

R – Quando toda uma escola se envolve nas actividades jornalísticas, o exercício de coordenação é deveras facilitado. É claro que tudo isto exige organização aturada e uma enorme disponibilidade de professores e alunos. Tem de haver um outro olhar dos serviços centrais e locais do Ministério da Educação, inclusive do ponto de vista de crédito horário. Enquanto se olhar apenas para cifrões, números e papéis e não para pessoas e actos e relações pedagógicos, será difícil alcançar os tão desejados níveis de aprendizagem.

P – O que se tem em conta quando se faz um jornal escolar?

R – As pessoas e os recursos ou aquilo que faz parte dos contextos sócio-educativos. Nos tempos que correm, fazer um jornal é uma aventura arrojada, mas compensadora. Como em qualquer projecto desta natureza, há aspectos que devem estar presentes. Em especial: objectivos; equipa; estatuto editorial; conteúdo; leitores; recursos; periodicidade; título; formato; ficha técnica; conselho de redacção; circulação e venda.

P – Qual é o contributo deste género de jornalismo escolar para as crianças?

R – Este tipo de trabalho feito na base dos pressupostos da actividade significativa (real, que espolete o rigor, o desafio, a qualidade e a excelência) melhora sem dúvida o processo de ensino-aprendizagem. Seja em que nível ou sector de ensino for. O jornalismo escolar encerra inúmeras virtualidades didácticas, pedagógicas, científicas, culturais, cívicas e tecnológicas.

P – As escolas estão preparadas para lidar com os jornais escolares?

R – São parcos os dados actualizados a nível nacional sobre os jornais escolares. De qualquer forma o jornalismo escolar tem vindo a ser implementado de forma incipiente. Há muito boa vontade, mas dada a parcimónia de meios e do cumprimento de outras solicitações burocrático-administrativas as dinâmicas vão soçobrando. Os jornais vão surgindo nas escolas ou porque há um professor que teve uma experiência no campo do jornalismo e consegue puxar alguns (poucos) colegas e alunos para a sua feitura; ou porque há um concurso local ou nacional; ou porque até é uma forma de publicar os trabalhos das várias escolas que pertencem ao agrupamento.

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