Arquivo

Fadiga governativa?

Apesar das sondagens continuarem a dar uma perceção de confortável apoio popular do Governo, há sinais de que a governação está a perder impulso. Não faltam exemplos, uns mais estruturais, outros nem tanto. Destacamos dois. Primeiro, a situação incerta da CGD, que se arrasta, prejudicando outras áreas da governação e prejudicando-se a própria instituição. Num contexto em que todos os bancos privados em Portugal deixaram ou estão em vias de deixar de ser portugueses, era indispensável que o maior banco de Portugal continuasse português e público. E isto não é apenas uma matéria de capitais, mas da atitude que se leva para dentro do banco. Todo o imbróglio em que o Governo deixou cair a CGD começou precisamente por ter querido uma administração do tipo da de um banco privado, com uma lógica aguda de mercado, em que ela própria não se via de outro maneira que não uma gama altamente cotada num segmento de mercado altamente sobrevalorizado. Oxalá, Paulo Macedo e Rui Vilar saibam ou possam corresponder às expectativas: de que a Caixa venha a ser mais gerida pelo cânone do bem público do que era e menos gerida pelo cânone de um banco privado.

Outro exemplo irrompeu nas notícias da semana passada. Depois de tudo o que se criticou, e bem, o exercício de Nuno Crato à frente da Educação, eis que os números não vão em cantigas e trazem para cima da mesa uma realidade desconfortável – a tendência de descida do abandono escolar foi interrompida este último ano. Podem encontrar-se justificações no facto do mercado de trabalho ter passado a ser novamente uma alternativa para muitos daqueles que têm o abandono escolar com uma possibilidade no horizonte mais próximo. Mas esta não é uma justificação politicamente aceitável. Pode ser uma explicação, mas não uma justificação. O Governo não pode tolerar-se a uma política de combate ao abandono escolar tão débil que não resista a uma maior oferta de mercado. Estabelecer condições para garantir essa contenção é a pedra de toque de uma política que combata estruturalmente o abandono escolar.

O Governo tem contado com uma importante solidariedade institucional do Presidente da República, apesar do que isso tem irritado a liderança do PSD, cada vez mais um partido que compreende pouco a importância do compromisso e sobrestima uma oposição do “contra”, ao ponto de sacrificar até a coerência. A “geringonça”, por seu turno, tem conseguido encontrar sempre saídas até agora. Com geometrias variáveis no Parlamento e muita habilidade de António Costa, os bloqueios têm sido ultrapassados. Mas isso não continuará a ser assim se as perspetivas de governação para 2017 forem de estagnação, sobretudo no que não depende de fatores externos, mas tão-só do Governo, como a capacidade de fazer boas políticas e conduzir reformas esclarecidas. É que o mandato do executivo vai demasiado no princípio para que acuse já fadiga.

Por: André Barata

Sobre o autor

Leave a Reply