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Facturas

O governo acaba de determinar o fim das vendas a dinheiro, das notas de crédito, de débito e, em geral, de todos os documentos comerciais equivalentes ou próximos da factura, à excepção da factura propriamente dita. Em princípio isto é bom. A simplificação dos papéis comerciais facilita os negócios e a escrituração das transações. A informatização do processo, então, é a cereja em cima do bolo. Á primeira vista, não há motivo possível para questionar a medida. Olhando melhor, há muito a dizer.

Em primeiro lugar, há o aspecto pidesco. Pidesco, para quem não conheça a palavra, é a qualidade daquele que bisbilhota e denuncia. Coisa feia, portanto. O pior é que os motivos subjacentes são torpes: a factura, no novo sistema, serve também para revelar o que se gasta (porque só dão direito ao benefício fiscal as facturas emitidas electronicamente com indicação do número de contribuinte – por isso para efeitos de cruzamento de informação) e para denunciar quem foge ao fisco, ao mostrar, através das facturas recebidas, e por comparação com os rendimentos declarados, as divergências entre o ganho real e o declarado. E porque são torpes os motivos subjacentes? É porque o acréscimo de impostos recolhido servirá para objectivos moralmente reprováveis, como por exemplo cobrir os prejuízos de bancos intimamente relacionados com os partidos do poder, tais como o BPN, ou para continuar a alimentar as cliques alternadamente no poder.

O aspecto pidesco é mau. Mas é mau também o que a alteração ao regime das facturas vem trazer. Milhares de pequenos comerciantes, vendedores ambulantes, feirantes, prestadores de serviços – aqueles, no fundo, que mantêm em condições de funcionamento a nossa economia – vão ser obrigados a gastar mais de mil euros para adquirir novo equipamento de facturação. Muita desta gente está já a pensar se vale a pena fazer o investimento. O negócio não ia muito bem, com tanto cliente a gastar menos ou a deixar de gastar, com tantos outros a atrasar pagamentos, e agora esta despesa extra é tudo menos bem vinda. Há mesmo quem diga que é esta a gota final, a que vai fazer extravasar o copo, e os muitos que achavam estar no limite do suportável deixaram de repente de ter dúvidas: o melhor é mesmo fechar.

Eis assim como uma medida que inicialmente parecia muito racional deixa muito depressa de oferecer dúvidas: o único objectivo era mesmo amplificar, agora com mais meios, a extorsão fiscal. O triste é que isto não vai resolver nada e vai criar mais falências e mais desemprego, como “eles” muito bem sabem.

Por: António Ferreira

Comentários dos nossos leitores
manuel manuel_zeeman@hotmail.com
Comentário:
Resta saber quem e que organismo será responsável pela importação, venda e instalação desta medida…
 

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